Marco Temporal: movimento indígena espera veto de Lula
Termina hoje o prazo para que o presidente contrarie decisão inconstitucional do Senado
Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil
As discussões acerca do marco temporal se arrastaram ao longo do ano, num ferrenho cabo de guerra entre parlamentares que representam os interesses do agronegócio e os povos originários no Brasil. E nesta sexta-feira (20), a questão passa por outro momento decisivo. Isso porque é o último dia para que o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), vete o PL 2903, aprovado pelo Senado no mês passado.
A desautorização de Lula seria muito simbólica no âmbito da questão indígena, ainda que, na prática, a tese já seja considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Antes do julgamento, as decisões da Justiça poderiam fixar que os indígenas somente teriam direito às terras que estavam em sua posse no dia 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal, ou que estavam em disputa judicial na época.
Em nota pública, o Ministério Público Federal (MPF) defendeu o veto de Lula na quinta-feira (19). por meio da Câmara de Populações Indígenas e Comunidades, o órgão destacou a inconstitucionalidade do PL e acrescentou que o regime jurídico de demarcações não pode ser alterado por meio de lei ordinária.
“A proposta provoca restrições ao exercício dos direitos garantidos aos índios pela Constituição, que não são possíveis por meio de lei. Mais ainda, por se tratar de direitos fundamentais, configuram-se cláusulas pétreas cuja alteração, portanto, não seria possível nem mesmo por meio de proposta de emenda à Constituição”, afirma o MPF.
‘Penduricalhos’
Na segunda-feira (16), o ministro da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, afirmou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva “tem compromisso com os direitos dos povos indígenas e compromisso com a Constituição brasileira”, quando questionado sobre a sanção da PL.Ele afirmou que os possíveis vetos estão em análise pelas diversas pastas do governo.
“Estamos aguardando a manifestação dos ministérios, temos até o dia 20 de outubro, prazo limite para essa decisão [para a sanção do texto]. Os vários ministérios estão começando a se posicionar, teremos reunião essa semana para tomar uma decisão final”, disse.
Conforme Padilha, o texto aprovado pelos parlamentares tem diversos “penduricalhos que agridem, inclusive, terras já demarcadas e identificadas como terras indígenas”.
“Desde as propostas de retorno dessas terras, retirada dessas terras das populações indígenas, de permitir práticas que não são aprovadas, inclusive, nos textos constitucionais”, disse.
O passar dos dias e o silêncio do Planalto vai aumentando a apreensão entre povos e militantes da causa indígena. Nesta semana, o Conselho Missionário Indigenista (Cimi) endereçou um novo documento a órgãos do governo federal, elencando as razões pela qual a entidade defende o veto total ao projeto.
“A forma de um Projeto de Lei Ordinária não possui competência para alterar, conter ou superar disposições constitucionais, que é do que se trata o estatuto jurídico-constitucional dos direitos indígenas, previsto nos artigos 231 e 232 da Carta Maior”, aponta o documento.
Ontem, lideranças dos povos Pataxó, Tupinambá e Tumbalalá reuniram-se, em Brasília, com a secretária nacional de Diálogos Sociais e Articulação de Políticas Públicas da Secretaria-Geral da Presidência da República, Kelli Mafort. Na ocasião, os líderes reforçaram a importância do presidente vetar integralmente o projeto.
“Esse PL é um genocídio para os povos indígenas, mas ele sendo vetado será um renascimento, para dos povos indígenas da Bahia”, argumentou o cacique Jucinaldo Tumbalalá.
Nas redes
Ao logo desta sexta-feira, vem se intensificando a pressão nas ruas e nas redes pelo veto presidencial. Usando as hashtags #MarcoTemporalNao, #VetaTudoLula e #PL2903Não, os manifestantes revelam sua preocupação com a implantação de uma política que pode não apenas entregar terras abundantes em riquezas naturais para a exploração da mineração e do agronegócio, como o próprio genocídio dos povos que serão exiliados dos territórios de seus ancestrais.
“O PL 2903 abre as terras indígenas para exploração e para empreendimentos que geram o extermínio, como a mineração, além de dar brecha para questionamentos judiciais sobre o processo demarcatório de todas as terras indígenas do Brasil. Não vetar o marco temporal é fazer coro com a afronta ao STF e acobertar os crimes dos invasores de terra indígena”, afirmou a professora Angela Alves Machado, ex-candidata ao governo do Paraná pelo PSOL, em suas redes sociais.
#MarcoTemporalNao, #VetaTudoLula e #PL2903Não