Faltam dados sobre crimes de homostransfobia no Brasil
Apesar de legislação estar em vigor há cinco anos, casos só passaram a ser contabilizados em meados de 2022
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A homotransfobia é considerada crime no Brasil há cinco anos, enquadrado na Lei do Racismo pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Quem infringir a lei pode ser condenado à pena de 2 a 5 anos de reclusão. A medida foi considerada uma vitória pela comunidade LGBTQIAP+ mas, na prática, a legislação não é adequadamente aplicada: até junho de 2022, nenhum caso foi enquadrado neste tipo de crime, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Conforme o conselho, até essa data, não havia sido criado um assunto processual específico para a discriminação contra LGBTs – quando os crimes passaram a ser classificados como intolerância ou injúria por identidade, expressão de gênero orientação sexual. Ainda assim, de lá para cá, apenas 60 casos foram enquadrados nessa tipificação, uma evidente subnotificação.
O gap de informações oficiais levou entidades como o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, que contabiliza os casos buscando boletins de ocorrência. Segundo o Fórum, houve 111 casos em 2020, 328 em 2021, e em 2022, 503 – um crescimento de 353%.
O advogado Paulo Iotti, responsável por defender punição pela lei do racismo nos casos de homofobia e transfobia perante o Supremo, vê a demora na criação de assunto processual sobre homotransfobia como “má vontade, inépcia e incompetência inacreditáveis” do Judiciário.
Em entrevista à Folha, ele disse que como a lei contra crimes raciais já previa tipificações por cor, etnia, religião e procedência nacional, não haveria barreira para incluir orientação ou identidade sexual. Ele afirmou ainda que uma solução para o problema seria que cada Estado instruísse suas polícias para “tipificar a vítima e mapear esses dados nos boletins de ocorrência”.
Isso já ocorre em São Paulo, onde desde 2015, os boletins contam com um campo para colocar homofobia ou transfobia como provável motivação do crime, facilitando a identificação dos casos.
A reportagem da Folha procurou os ministérios da Justiça e Direitos Humanos para comentar a ausência de dados oficiais sobre casos de homofobia criminalizados no país. Apenas a pasta da Justiça se manifestou, dizendo valorizar o registro adequado dos crimes.
“Por meio da Secretaria Nacional de Segurança Pública e da Secretaria de Acesso à Justiça, o ministério estuda medidas que possam ser adotadas para aprimorar a qualificação das denúncias desse grupo social na segurança pública e nas instituições de Justiça”, continuou.
Integrante do Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero, Gustavo Coutinho classifica a situação como “omissão do Estado”.
“Apesar de termos muitas decisões judiciais sobre direitos homo e trans no Brasil, temos ainda uma baixa institucionalização desses direitos, principalmente pela ausência de lei específica e iniciativas por parte do Poder Executivo”, afirmou à Folha..