Paraíso do Tuiuti: uma celebração da resistência e da identidade trans 
Paraíso do Tuiuti

Paraíso do Tuiuti: uma celebração da resistência e da identidade trans 

Escola de samba levou à Sapucaí enredo que celebra a trajetória de Xica Manicongo e denuncia a violência contra a comunidade LGBTQIAP+

Tatiana Py Dutra 5 mar 2025, 01:13

Foto: Fotos Públicas

O Carnaval sempre foi palco de manifestações culturais e políticas, e neste ano, a Escola de Samba Paraíso do Tuiuti protagonizou um dos enredos mais significativos da história do samba. Com a corajosa escolha de trazer para a Sapucaí a trajetória de Xica Manicongo, reconhecida como a primeira travesti não-indígena documentada no Brasil, a agremiação presta um tributo à luta da comunidade LGBTQIAP+ e denuncia as violências que essa população enfrenta.

Xica Manicongo chegou ao Brasil durante o período colonial, trazida como escravizada e registrada sob o nome de Francisco. Entretanto, sua identidade nunca esteve atrelada ao gênero masculino. Dentro da brutalidade da escravidão, Xica manteve suas práticas religiosas e encontrou acolhimento junto ao povo Tupinambá, na Bahia, onde conseguiu preservar sua essência e resistir à imposição de identidades que não condiziam com quem realmente era. A história del é um poderoso símbolo de luta contra a opressão, um grito por identidade e liberdade que ecoa até os dias de hoje.

Um grito contra a violência e à marginalização

O Brasil, há 16 anos, lidera o ranking mundial de assassinatos de pessoas LGBTQIAP+. A população trans, em especial, enfrenta um ciclo cruel de marginalização, sendo frequentemente expulsa do convívio familiar e empurrada para a prostituição como única forma de sobrevivência. O preconceito estrutural e a falta de oportunidades resultam em uma realidade alarmante: pessoas trans e travestis vivem, em média, até os 35 anos no Brasil, vítimas da violência e da indiferença social.

Apesar das dificuldades, muitas pessoas trans e travestis desafiam as estatísticas e conquistam espaços de destaque na sociedade. Professores, pesquisadores, médicos, artistas e parlamentares representam uma nova era de visibilidade e reconhecimento da comunidade trans.

Neste contexto, a Paraíso do Tuiuti promove uma das mais emblemáticas homenagens já vistas no Carnaval: 28 personalidades trans e travestis de destaque foram convidadas para desfilar na escola, incluindo a deputada federal Erika Hilton (PSOL), que, além de brilhar na Avenida, também recebeu o título de Cidadã Honorária na Marquês de Sapucaí por sua luta pelos direitos LGBTQIAP+.

Entre as figuras que foram homenageadas, estão artistas, ativistas e políticas como Duda Salabert, Dani Balbi, Jovanna Baby, Bruna Benevides, Angela Leclery e muitas outras.Mulheres que representam a força e a resiliência de uma população que, mesmo diante da hostilidade, continua lutando por direitos, reconhecimento e dignidade. A Comissão de Frente apresentou a intenção da escola, trazendo 15 mulheres trans.

A modelo Daniela Arrais, que representou Xica no quesito, valorizou a iniciativa da escola:

“[Esse enredo} é pra mostrar que a gente tá aqui. A gente vive, a gente sonha, a gente chora, a gente trabalha. Chega de nos excluir, sabe?  Essa é uma oportunidade de eu e minhas irmãs mostrarmos que nós somos potentes, que nós queremos ser, não adianta tentar nos parar. Não adianta tentar nos matar. A gente vai viver e contar a nossa história. A Xica está por nós, a Xica vive em nós e eu não estou aqui por mim, estou pelas  minhas ancestrais, as que vieram antes, as que estão agora e as que ainda vão vir”.

“Esse enredo traz o amor pelo direito humano,comissão de frente que é o direito à vida”, disse um dos coreógrafos do quesito Edifranc Alves.

Um chamado à consciência 

A Paraíso do Tuiuti não apenas faz história com este enredo, mas também convoca a sociedade a refletir e agir. O samba-enredo deste ano reforça a mensagem de que não há democracia plena enquanto houver violência contra a população LGBTQIAP+.

O Carnaval é resistência, é ocupação de espaços e é celebração da diversidade. O desfile da escola se torna, assim, um marco na história do samba e na luta pelos direitos humanos, uma explosão de cor, cultura e, sobretudo, de reafirmação da existência trans e travesti.

Ex-carnavalesco e comentatista da TV Globo, Milton Cunha celebrou a iniciativa e pediu que a sociedade brasileirae comprometa com a inclusão, o respeito e a construção de um país mais justo para todas as identidades.

“Eu, do meu lugar de fala, tiro o chapéu pra escolas de samba como Tuiuti, tiro chapéu pro presidente Thor por ter coragem de nos trazer nós, LGBTQIAPN+, excluídos, apontados, assassinados, pra esse lugar de visibilidade que é a Marquês de Sapucaí – disse. “Todos os seres humanos, parem de nos matar. O Brasil é o país que mais nos mata no mundo. É dramático, é veemente cada dedo que nos aponta, cada olhar. Nós somos crianças espancadas, nós somos crianças jogadas para o escanteio. A gente não pode ir na sala porque os vizinhos, os juízes, os diretores de colégio, os padres, todo mundo odeia a gente” -lamentou. “Que venha a Tuiuti, que venha Xica Manicongo nos representar e dizer: ‘Nós somos seres humanos, nós merecemos todo o respeito do mundo.’ Viva a tolerância, viva a democracia, viva a fraternidade, vida o humanismo”, concluiu.

Harmonia e evolução

Infelizmente a escola – cotadíssima para ir às cabeças na noite das campeãs – demonstrou dificuldade de evolução e precisou se apressar para deixar a Marquês de Sapucaí no tempo máximo de 80 minutos, previsto na regra. O afobamento pode deixá-la fora do pódio, mas jamais da memória de quem viu uma história (antes apagada) transformada em enredo na grande festa nacional.


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