Quanto custa uma IA? A super-exploração humana e ambiental
Se na aparência a IA facilita tarefas e supostamente nos libera tempo, por outro lado ela tem um impacto profundo tanto no meio ambiente como em uma nova forma de exploração do trabalho muito pouco visibilizada até agora
Via Juntos!
O uso de inteligência artificial (IA) se prolifera cada vez mais para tarefas do cotidiano; sejam tarefas de trabalho como tradução de textos, transcrição de áudio, produção de slides; sejam usos pessoais, que vão de organização de lista de compras até alguns casos de uso como se fosse uma terapia (mesmo que não tenha nada a ver). No entanto, se na aparência a IA facilita tarefas e supostamente nos libera tempo, por outro lado ela tem um impacto profundo tanto no meio ambiente como em uma nova forma de exploração do trabalho muito pouco visibilizada até agora.
As IAs se tornaram a mais nova saída para buscar ampliar a acumulação do capital. Em algumas empresas, tornam possível substituir milhares de trabalhadores, realizando rapidamente tarefas que antes exigiam times, e em alguns casos até com mais precisão. Em outras empresas, as demissões ocorrem não para substituir as tarefas, mas para priorizar as IAs. Microsoft, IBM, Duolingo, são só algumas das companhias que vêm realizando demissões em massas motivadas por IA.
Como tudo na produção capitalista, o avanço das IAs também gera um custo alto para o meio ambiente. As operações e o treinamento das IAs exigem dos “data centers” um consumo de energia e água muito superior ao de outras finalidades. Cada pesquisa em IA consome 10 vezes mais eletricidade do que uma pesquisa no Google, por exemplo. A previsão é de até 2030, esses data centers sejam responsáveis pelo consumo de 3% da energia mundial. Para garantir o resfriamento deles, se espera que até 2027 sejam consumidos 4,2 a 6,6 bilhões de metros cúbicos de água (lembrando que cada metro cúbico equivale a mil litros).
Serão necessárias, cada vez mais, grandes obras de usinas geradoras de energia, a manutenção dos combustíveis fósseis como base primária da geração e os conflitos em torno de água. O mega data center que o Tiktok pretende construir no Ceará é exemplo disso, retirando água de uma região propensa a seca. De acordo com o Intercept, além desse outros 22 data centers estão em processo de autorização pelo Ministério do Meio Ambiente, sendo 5 deles em regiões de seca.
Mas não é só o meio ambiente que é superexplorado por essa nova forma de tecnologia. Para realizar o treinamento das IAs e aprimorar a capacidade e precisão delas, é necessário trabalho humano. O ChatGPT, por exemplo, utilizou trabalhadores quenianos pagando menos de U$ 2 dólares por hora. Em países do Sul Global, como Venezuela, Quênia e especialmente Filipinas, vemos uma proliferação de verdadeiras fábricas do suor (“sweatshops”), uma exploração profunda de trabalhadores que passam o dia clicando em captchas por centavos de dólares. Só nas Filipinas, havia cerca de 2 milhões de pessoas nessa situação em 2023.
Empresas como a Remotask possibilitam essa exploração com uma plataforma uberizada, que não é submetida às legislações trabalhistas desses países e completamente opaca aos trabalhadores. São muitos os relatos de valores recebidos a menos do que o contratado por determinada tarefa, de desligamento da plataforma sem justa causa e sem liberação do dinheiro a que tinham direito, e outros tipos de problemas denunciados pelos trabalhadores e também por executivos dessas companhias.
Executando uma espécie de nova colonização digital, as IAs se utilizam dos recursos naturais e humanos dos países do Sul Global a custos baixíssimos para garantir o lucro de bilionários no Norte Global, como Elon Musk, Sam Altman e Alexandr Wang. E não apenas o lucro, mas também a manutenção dessas plataformas como perpetradoras das desigualdades sociais, e espaços prolíficos para o desenvolvimento da extrema-direita.