Sobre o 1º de Maio: tragédia em São Paulo, lutas e tarefas

Em meio à crise em que se encontra o Brasil, é preciso resgatar a força, a independência e o projeto da classe trabalhadora.

Israel Dutra e Thiago Aguiar 2 maio 2018, 23:04

1º de maio foi marcado por uma tragédia no coração da classe trabalhadora em São Paulo, com desabamento e incêndio no centro da cidade. E também por manifestações multitudinárias pelo mundo. Os atos no Brasil foram pequenos e dispersos.

Há 132 anos, nas condições degradadas das fábricas de Chigaco, os mártires do movimento operário, em combate, foram condenados à morte pela burguesia. Sua luta, contudo, foi eternizada como representação coletiva da luta por mais direitos e pela redução da jornada de trabalho. No Brasil de hoje, também temos mártires que expressam a luta da classe e de todo povo, como a simbolizada por Marielle Franco, ícone da luta pelos direitos das mulheres negras, lésbicas, da luta das favelas e contra a ação de mílicias.

Nas lembranças mais recentes, ainda segue viva a grande greve geral de 28 de abril de 2017 que completa um ano. Naquele momento, 45 milhões de trabalhadores cruzaram os braços, numa impressionante demonstração de força, com manifestações em quase todos os centros urbanos, com a paralisação dos setores mais importantes da indústria e da circulação. Com a mobilização, o governo foi derrotado no debate sobre a reforma da previdência.

Ao mesmo tempo, Temer foi colocado contra as cordas, com a combinação da luta contra as reformas, a marcha a Brasília e o escândalo da JBS. Infelizmente, no momento de maior dificuldade de Temer, o recuo das centrais na mobilização criou a oportunidade para o governo aprovar a reforma trabalhista, um ataque sem precedentes que debilita a classe trabalhadora.

O 1º de Maio no Brasil e no mundo

O mundo assistiu a fortes manifestações do 1º de maio, com destaques para os conflitos em Paris, onde está em curso forte contestação às privatizações e ataque aos direitos trabalhistas promovidos por Macron, e em Istambul, com dura repressão do governo Erdogan contra os manifestantes. Honduras, Costa Rica, Inglaterra e Filipinas conheceram também atos e protestos de dezenas de milhares. Nos Estados Unidos, no calor da rebelião docente que toma diversas regiões do país, ganhou força a representação dos trabalhadores imigrantes e a raiva contra o governo de Trump.

No Brasil, como dissemos, os atos foram pequenos. Uma demonstração da fraqueza das principais centrais sindicais. Principal força política da oposição, o PT não tem força para sair de sua situação defensiva e ainda não tem uma política de unidade verdadeira na medida que sua defesa da unidade pressupõe a defesa da política de Lula e não apenas a unidade pelo seu direito de responder em liberdade. E as mesmas centrais e movimentos acabaram secundarizando a pauta da luta contra a implantação da reforma trabalhista e das demandas concretas da classe.

Em meio à crise em que se encontra o Brasil, é preciso resgatar a força, a independência e o projeto da classe trabalhadora, enfrentando as tentativas de interdição de sua voz a respeito da situação política nacional.

Um Brasil mais desigual, precarizado e a chaga do desemprego

A recente pesquisa divulgada pelo IBGE contradiz o discurso do governo. O que os economistas oficiais chamam de “despiora” é, na verdade, um retorno aos altos índices de desemprego do ano passado. Os dados do primeiro trimestre mostram uma taxa de desemprego que alcança 13%. Ao mesmo tempo, as novas modalidades de contratos flexíveis aprovadas na reforma trabalhista e os ataques mais explícitos, que permanecem em vigor com a queda da validade da MP808, acentuam os ataques como problema geral. Como afirmou o sociológo Ruy Braga em recente entrevista na Rede Brasil Atual:
“Não tenho dúvidas a respeito dos efeitos relativos à concentração de renda e à massa salarial no país. (…) É possível imaginar cenários levando em consideração os dados. Se você avalia os dados do trabalho terceirizado e do trabalho contratado que ocorria até 2015, é possível perceber que o nível salarial do trabalhador terceirizado era de 23% a menos do que o do trabalhador diretamente contratado. Isso nos indica um parâmetro, ou seja, o trabalhador terceirizado e submetido ao trabalho intermitente, provavelmente num período de tempo curto, perceberá seu salário cair em cerca de 20%”, compara. E lamenta: “O que se multiplicou foi o trabalho indecente, que avança sobre o tempo livre, com acréscimo da insegurança, que multiplicou o subemprego e a sub-remuneração, que não paga o mínimo para que as pessoas possam se manter”.

Temer e Henrique Meirelles precisam desvencilhar-se das novas denúncias de corrupção para se apresentar como saída para seguir a agenda do ajuste fiscal contra os direitos.Para a burguesia, a única saída para o Brasil é a continuidade do ajuste, ou seja, o aumento da superexploração e da precarização do trabalho, além da aprovação da reforma da previdência da previdência para “sanear” as contas públicas.

Resistência e lutas parciais

No Brasil, desde o desmonte da segunda greve greve geral em 2017, não se construiu uma luta ou agenda unificada como pronunciamento dos interesses dos de baixo. Entretanto, há lutas parciais e locais com relevância. A aprovação da PEC55 — com o congelamento dos gastos públicos nacionais — e o recuo da tramitação da reforma da previdência no Congresso Nacional levaram os estados e municípios a tomar suas “responsabilidades” de promover o ajuste, incendiando categorias de servidores em todo do país.

A mais importante destas lutas foi a vitória de profissionais da educação e de servidores municipais de São Paulo contra o Sampaprev de Doria (PSDB). Professores no Amazonas, municipários de Florianópolis, rodoviários da região metropolitana de Belém, por fora de sua direção sindical: todas mostram uma tendência à generalização de enfrentamentos locais contra os governos e o ajuste. Em Minas Gerais, a luta da educação também enfrentou a repressão covarde da polícia de Fernando Pimentel (PT).


Uma tragédia em São Paulo

Este também foi um 1º de maio de grande comoção no Brasil pelo incêndio e desabamento do edifício Wilton Paes de Almeida, no centro de São Paulo. O prédio, de propriedade da União, passou anos vazio até ser ocupado por dezenas de famílias sem-teto. O incêndio, que até onde se sabe deixou um morto, representa de forma dramática a crise social que vive o Brasil e o descaso com a miséria de milhões de brasileiros que não tem moradia digna para viver com sua família. Os políticos burgueses, como Doria e Covas, trataram de associar os sem-teto a criminosos e prometer “mapeamento” de ocupações. Pretendem usar o desespero das famílias como pretexto para sua política higienista e favorável à especulação imobiliária. Temer, por sua vez, tentou tirar proveito da situação para promover uma “agenda positiva” de visita aos desabrigados. Terminou expulso pelo povos sob gritos e chutes.

Mais uma vez, a luta por moradia, que tem mobilizado centenas de milhares de trabalhadores em luta nos últimos anos, volta ao centro dos acontecimentos. A força do MTST é a demonstração disso. A campanha de Guilherme Boulos à presidência pelo PSOL é certamente uma oportunidade de denunciar as mazelas da política urbana e habitacional do Brasil, a serviço dos lucros bilionários das empreiteiras, dos lucros financeiros dos bancos e da especulação de terrenos.

A partir do mandato de Sâmia chamamos a solidariedade concreta, difundindo os pontos de recebimento de doações, bem como a denúncia da responsabilidade dos governos. 


Apoiar e politizar as lutas

É preciso apoiar e construir cada luta parcial em curso, por direitos como moradia e e contra os ataques dos governos e patrões. A tarefa da esquerda socialista é estimular a unificação destes conflitos numa luta nacional contra o ajuste da burguesia. Ser solidário às lutas e defender a Petrobrás das privatizações: eis o próximo round da luta contra o governo.

Para isto, é preciso construir uma plataforma política dos de baixo, com força para repudiar e enfrentar a extrema-direita. Completando 50 dias do assassinato de Marielle, nosso chamado ao conjunto do movimento é repetir a exigência por imediatos esclarecimentos: “Quem matou e quem mandou matar Marielle e Anderson”?

Ao mesmo tempo, devemos construir uma grande campanha do PSOL nacionalmente e também nos estados. Este será um ponto de apoio fundamental para as lutas em curso e para o futuro.


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Pedro Micussi