Sobre a manobra parlamentar do impeachment

As tarefas da esquerda socialista uma vez consumado o processo de impeachment de Dilma Rousseff.

Secretariado Nacional do MES 10 set 2016, 19:08

A votação do impeachment no Senado consumou um golpe palaciano, na forma de manobra parlamentar, retirando a faixa presidencial de Dilma Rousseff. Neste dia 31 de agosto mais de 75% dos senadores (61 contra 21) consumaram o fato e retiraram a ex-presidenta do poder. Assim como na votação da Câmara de 17 de abril, a casta política escancarou ao vivo seu distanciamento com os reais problemas do povo.

Longe de estancar a sangria da crise, esta manobra viabiliza um governo tão ilegítimo quanto impopular. Com o principal cargo do executivo nacional assegurado Michel Temer compareceu às câmeras televisivas para anunciar que sua gestão estará a serviço do ajuste fiscal e do aprofundamento das medidas neoliberais. O cardápio reacionário de Temer/Meirelles está recheado de cortes nos direitos trabalhistas, um aumento na idade da aposentadoria, um plano de congelamento de gastos sociais por incríveis 20 anos, a redução dos direitos políticos dos partidos de esquerda, especialmente contra o PSOL, como o caso da cláusula de barreira, entre outras medidas.

Todo esse pacote de maldades de um governo não-eleito vem em meio à uma crise social aguda, alimentada por uma situação econômica que não dá sinais de melhora. A taxa de desemprego cresce e já é a sétimo maior do mundo. A crise da dívida explode nos municípios e Estados ocasionando os mais diversos problemas sociais. A insegurança já domina os grandes centros urbanos, a Saúde pública se deteriora, e os planos privados já não são opção por grande parte das famílias endividadas. A educação e a pesquisa já retrocedem anos com o escasso financiamento e o corte de bolsas.

Os dias de ilusões do “Brasil emergente” terminam de forma melancólica. O futuro não chegou. O PT cavou sua própria fossa ao se integrar às castas políticas corruptas, desenvolvendo uma forma de governo social-liberal que privilegiava fundamentalmente os ricaços em detrimento de sua base social. A posse de Temer foi a culminância de um conjunto de derrotas dirigidas pelas lideranças do PT, que se tornou um organizador de derrotas. Mesmo impopular, Temer consegue assumir sem resistência massiva porque a esmagadora maioria do povo não queria e não quer mais o governo do PT e de Dilma. Por isso, embora de forma ilegítima, Temer pode assumir sem ter que enfrentar o povo. Não há assim uma derrota do povo porque suas forças não foram testadas, porque em última instância o povo não saiu à luta e não tomou o conflito que tirou Dilma como um problema seu. É claro que há desorganização das forças populares e sobretudo ceticismo, resultado da direção do PT. Mas mesmo neste momento o povo busca una alternativa, uma parte do povo busca isso, como expressa a existência e a força atual do Psol. Há muitos lições a se extrair. Foram 30 anos de hegemonia do PT. Como não poderia deixar de ser há muitas lições desta experiência. Destas lições sustentamos que há necessidade de um novo programa e de uma estratégia nova.

Apesar da manobra bem sucedida pelas forças genuinamente representativas da burguesia e do conservadorismo, a situação deles para se estabilizar não será fácil. Praticamente todos os presidenciáveis para 2018, os líderes dos grandes partidos na Câmara e no Senado, os manda-chuvas do regime político estão na mira das investigações. O transbordamento da Lava-Jato já atinge toda a casta política, vide o presidente do PSDB goiano preso por operar um esquema de corrupção no seu governo estadual. Esta operação se tornou uma espada de Dâmocles sobre a cabeça dos políticos, apesar da sua instrumentalização pela mídia corporativa. O prestígio popular que os procuradores angariaram, ao prender empresários e políticos, dificulta a tarefa dos golpistas de sufocá-la.

Do nosso lado, temos o dever de servir para a organização das lutas sociais e políticas que estão por vir, em resistência a este governo reacionário e ilegítimo. O desafio concreto é fortalecer as nossas iniciativas de rua, militando incansavelmente para unir a luta por mais direitos com uma saída política.

Os processos de resistência se darão nos atos de rua, mas também nas ocupações de prédios públicos, na retomada das lutas sindicais e na reorganização de grandes frentes de lutas contra os retrocessos nos direitos sociais e políticos propostos por este governo. Porém neste momento agora o centro da disputa se dará a partir da apresentação de projetos distintos nestas eleições municipais. Neste processo, o PSOL aparece com chances interessantes de catapultar o sentimento geral de estafa com os partidos afogados no pântano da corrupção. Em Porto Alegre, Luciana Genro lidera heroicamente as pesquisas à prefeitura. O mesmo ocorre em Belém do Pará com Edmilson Rodrigues. No Rio e em São Paulo, a força de Freixo e Erundina nas pesquisas obriga o STF e a mídia corporativa a aceitar nossa participação nos debates. Se o pouco tempo de TV e a escassez de recursos atrapalham sobremaneira as nossas campanhas, temos a nosso favor um engajamento juvenil nas redes sociais que até os partidos burgueses são obrigados a reconhecer.

Um novo ciclo precisa se abrir, agora que o velho já esgotou seu sentido histórico. O sentido comum da posição do PSOL nas pesquisas, a reorganização sindical – onde acabamos de ter uma vitória importante no Sindsaúde-RS – o que indica que a recomposição é geral. É a partir das lutas de resistência e na apresentação de alternativas nas eleições é que aceleramos os tempos e derrotaremos o projeto nefasto que a burguesia apresenta para o nosso país.


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Pedro Micussi