Freixo e o Labirinto da Esquerda Brasileira

Freixo e o Labirinto da Esquerda Brasileira

Raul Marcelo reflete sobre o labirinto social e político sobre o qual a esquerda brasileira se encontra e aponta possíveis caminhos para sua superação.

Raul Marcelo 14 jun 2021, 11:20

“Hegel observou, certa vez, que todos os fatos e personagens de grande importância na história universal ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa.” Karl Marx, O dezoito Brumário de Loius Bonarparte

A recente notícia da saída do Deputado Freixo do Psol para o PSB, Rio de Janeiro, está de longe de ser uma decisão pessoal, em “defesa da democracia frente ao avanço do Bolsonarismo” como quis fazer parecer o parlamentar carioca em uma nota publicada em sua rede social. O que mais preocupa e que me fez tomar a liberdade de citar o “Dezoito Brumário” é que a ida de Freixo ao PSB, faz parte de uma articulação da direção do PT de montagem dos palanques regionais, em apoio à candidatura de Lula a presidente e, ao que tudo indica, o caminho será à direita, uma clara sinalização da tentativa de reeditar 2002.

Em relação ao curioso argumento do Deputado da “defesa da democracia” que foi usado para fazer um giro à direita, registro que  na eleição presidencial de 2014, quando o candidato era Eduardo Campos depois substituído por Marina Silva, o PSB introduziu no debate público brasileiro a “progressista” Bandeira da Autonomia do Banco Central, conquista só agora alcançada no governo Bolsonaro pela Burguesia Brasileira. Para se ter uma ideia do absurdo dessa política saímos de uma Taxa Selic de 2% em janeiro e já estamos em 3,50% com previsão de chegarmos a 6% no final do ano, como a dívida está em 90% do PIB, vamos transferir aproximadamente 3,6% do PIB Brasileiro para os Bancos e às famílias milionárias que compraram títulos públicos.

Para efeito de comparação o auxílio emergencial custou 4% do PIB, em 2020, exatos R$ 295 bilhões e atendeu 68 milhões de brasileiros, enfim, é isso em uma canetada o BC “autônomo” tão defendido pelo então candidato à Presidente do PSB, vai canalizar para o andar de cima, sem nenhum debate com a sociedade, quase R$ 300 bilhões em juros. Reduzir a Democracia a manutenção do calendário eleitoral é retirar a sua substância que são os Direitos Sociais, o que no Brasil para grande maioria do povo sempre foram uma miragem, um verdadeiro pote de ouro no final do arco-íris.

O cumprimento dos Direitos Sociais, previstos na Constituição de 88, não avançaram no Brasil porque o capitalismo em sua fase neoliberal capturou o orçamento público e subordinou o Estado Brasileiro e quase todo o espectro partidário a sua política econômica; por trás da cortina de fumaça da “responsabilidade fiscal”, “ajuste fiscal” e o recente “teto de gastos” se esconde o mecanismo de apropriação do orçamento público via rolagem da dívida pública pelo Banco Central. Somado a este processo temos ainda a apropriação dos bancos, via taxas de juros exorbitantes na média 300% para rolagem do cartão de crédito ou cheque especial e também, a carcomida e velha conhecida Mais-Valia nas relações de trabalho que no Brasil sempre foram exponenciais, dada a característica fundamental da nossa economia que é a super exploração do trabalho, aliás, desde os anos 90 esse processo vem se aprofundando. Em 1995, primeiro ano do governo FHC, havia 1,8 milhão de terceirizados no país, em 2005, terceiro ano de Lula, eram 4,1 milhões, quando Dilma sofre o golpe o número de terceirizados no Brasil chega a 12,7 milhões, representando 27% do mercado formal de trabalho no Brasil e recebendo 25% menos em média. Defender a “Democracia” sem defender os direitos dos trabalhadores é jogar palavras ao vento.

A burguesia Brasileira está dividida sobre o apoio ao Bolsonaro, mas não se iludam, tem total acordo na política monetária e de privatizações da dupla Guedes/Campos, essa pode ser a chave para entender por que o Impeachement não anda na Câmara e no Senado. Os ganhos das 500 maiores empresas privadas de capital aberto na Bolsa de Valores de SP, em meio a crise de 2020, mostram que é a valorização do Capital que importa para o andar de cima, enquanto o PIB encolhia 4% a taxa de lucro se manteve em 9,2%, vide gráfico abaixo.

Estudo elaborado pelo Professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Eduardo Costa Pinto.

Limitar a crítica ao Bolsonarismo a questão sanitária é insuficiente para tirar o Brasil do labirinto em que nos encontramos. Caminhamos para 500 mil mortos pela Covid-19, sem perspectiva de futuro com aproximadamente 50 milhões de trabalhadores jogados no desemprego, desalento e subemprego sofrendo todo tipo de humilhação diária.

A aliança com a Burguesia, em 2002, foi sacramentada na famigerada “Carta ao Povo Brasileiro” onde Lula e a Direção do PT se comprometeram em não alterar a política econômica. Tentar reeditar esse processo novamente à luz de todos os acontecimentos históricos que o País sofreu: junho de 2013, crise econômica de 2015 e 2016, golpe contra Dilma, prisão do Lula, chegada de Bolsonaro ao governo e a ascensão do movimento ultrarreacionário no país é não querer ver o óbvio, as contradições do desenvolvimento Capitalista no Brasil se aprofundaram enormemente demandando dos setores populares uma resposta a altura dos desafios da atual conjuntura.

Em que pese as divergências em torno das medidas de enfrentamento da pandemia, a realidade é que a Burguesia Brasileira marcha unida em torno do ajuste fiscal, redução dos direitos trabalhistas e reprimarização da economia.

Para tirar o Brasil do labirinto em que nos encontramos é preciso ter coragem e audácia para abrir um novo ciclo político, e isso só será possível com as ruas voltando a falar e a esquerda apontando um caminho de ruptura com a atual ordem vigente; reeditar 2002 em 2022, além de virar uma grande farsa, pode significar uma derrota histórica de profundas consequências para os trabalhadores do Brasil. Que o PT, PSB e demais correntes políticas trilhem esse caminho é até compreensível, mas não o Psol, fomos forjados na crítica a capitulação de setores esquerda, quando muitos cederam, nós organizamos a resistência e chegamos até aqui, aliás, em 2022 completaremos 18 anos, nas ruas, no parlamento, na formação política e na luta do Povo. Manter nossa independência, nosso programa e a construção de um contrapoder popular no Brasil deve ser o centro da nossa política.

O futuro da Democracia no Brasil vai ser jogado nas ruas e o caminho para sairmos do labirinto social e político é um programa radical. Um programa Socialista.


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Pedro Micussi