Ainda é Cedo Demais para Debater Táticas para Novembro
Membros do DSA na Marcha das Mulheres em Nova York em Janeiro de 2017 - Cortesia do DSA

Ainda é Cedo Demais para Debater Táticas para Novembro

A questão da tática do DSA para a eleição presidencial é melhor ser deixada para quando soubermos com certeza se Biden será o indicado. A questão urgente agora é como conquistar um Cessar-Fogo em Gaza

Neal Meyer 19 fev 2024, 16:30

Via Left Notes
https://leftnotes.substack.com/p/its-too-soon-to-debate-tactics-for

Para muitos socialistas, como eu, a questão mais urgente neste inverno é conquistar um cessar-fogo em Gaza. A campanha genocida de Israel já matou quase trinta mil pessoas neste momento. Isso precisa parar. Joe Biden e os Democratas não nos deram motivo algum para acreditar que há qualquer diferença entre sua política e a política de uma possível segunda administração de Donald Trump.

O fato de não haver um candidato “menos pior” quando se trata do genocídio em Gaza representa um desafio para todos que também estão justificadamente preocupados com uma possível segunda presidência de Donald Trump. Os dois partidos estão muito distantes na outra grande questão do ano: O que acontecerá com os importantes direitos democráticos, trabalhistas e civis que tornam possível nos organizarmos em público e legalmente e ter esperança de mudar os EUA para melhor? Enquanto Biden e os Democratas fizeram melhorias marginais em algumas questões trabalhistas e de direitos civis comparado com como estava em 2021 quando começaram, Trump promete uma onda de reação.

Como poderia ser uma nova era de reação patrocinada por Trump? Sua campanha tem sido notavelmente franca sobre suas intenções.

Trump pretende:

  • Usar a Lei da Insurreição para enviar o exército dos EUA para reprimir grandes protestos.
  • Fazer pleno uso dos poderes de acusação disponíveis ao presidente para travar o que camaradas na América Latina chamam de “lawfare” contra rivais políticos, aproveitando ao máximo um judiciário repleto de juízes de direita para derrotar os opositores de Trump.
  • Reprimir brutalmente os direitos das pessoas trans.
  • Preencher o NLRB (agência independente do governo federal dos Estados Unidos que aplica a legislação trabalhista dos EUA em relação à negociação coletiva e práticas trabalhistas injustas) com indicados pró-empresariais e fazer o possível para desarticular o movimento sindical insurgente nos Estados Unidos.
  • Proibir “comunistas, marxistas e socialistas” de obter um visto para entrar nos EUA, submetendo qualquer pessoa que queira visitar o país a triagens ideológicas, semelhantes à forma como ele baniu muçulmanos no último mandato. (Para que você não pense que ele não pode fazer isso, a lei de imigração dos EUA escrita durante a Ameaça Vermelha, período de forte desenvolvimento do anticomunismo nos EUA, explicitamente dá poderes ao presidente para fazer isso.)
  • Lançar uma campanha sem precedentes de deportação em massa, com o objetivo de prender e deter milhões de imigrantes que não têm documentos em “campos” recém-construídos em todo o país. Os imigrantes serão mantidos nesses campos até serem deportados, e ele tem planos de negar-lhes qualquer tipo de devido processo legal para apelar seu destino. (A política de imigração de Biden tem sido uma verdadeira continuação deplorável de muitos dos crimes do primeiro mandato de Trump. Mas, tão ruim quanto isso é, Trump promete aumentar a aposta de uma maneira para a qual muitos de nós não estamos preparados.)

Isso é apenas parte do que Trump e os Republicanos dizem publicamente que pretendem fazer. Não é muito reconfortante pensar que eles realmente não vão seguir adiante com isso. De fato não há garantias na política, então é possível que Trump não consiga ou não queira implementar essas políticas no final. Mas devemos fazer uma aposta com base nessa esperança? A ameaça parece real. A maioria de nós acredita, com bastante razoabilidade, que se um assaltante diz “Eu tenho uma arma”, devemos levar a ameaça a sério, mesmo que não possamos ver a arma. Eu apoio seguir uma lógica semelhante em 2024.

A prometida onda de reação de Trump definitivamente está em minha mente quando penso sobre a eleição geral. Além disso, embora não haja motivo para pensar que o resultado da eleição trará algum alívio para o povo de Gaza, como agirmos no próximo ano — e como aproveitarmos as oportunidades de organização que vêm com uma grande eleição geral — poderia ajudar a inclinar a balança para a conquista de um cessar-fogo. Ao pensar em “o que deve ser feito” em 2024, também acho necessário distinguir como os socialistas em grandes organizações de movimento lidam com a questão de como o DSA enquanto DSA lida com ela. E também é importante não apressar um debate sobre as táticas do DSA na eleição geral quando Biden pode não ser o indicado e há questões muito mais importantes para o DSA responder agora.

Tarefas para Socialistas em Grandes Organizações de Movimento

A tática correta para o ainda bastante significativo movimento sindical e outras importantes organizações de movimento em 2024 pode não ser a mesma para o movimento socialista, pelo menos neste inverno e nesta primavera.

Do ponto de vista do grande movimento do qual fazemos parte, que inclui socialistas, mas também a ala esquerda do movimento sindical, vários movimentos sociais, etc., acredito que a realidade é que as organizações líderes em nosso movimento — e os membros do DSA que fazem parte delas — realmente não têm escolha.

O desafio enfrentado pelo presidente da UAW, Shawn Fain, e outros líderes do sindicato era real, e no final eles escolheram endossar Biden. Eu esperaria que um sindicato como o UAW lutasse com todas as forças e esgotasse todas as opções para obter concessões de Biden, especialmente em relação a um cessar-fogo. Além disso, se eu tivesse a atenção dos líderes da UAW, apoiaria o adiamento do endosso, não convidaria Biden para falar, seria ainda mais crítico em relação aos Democratas e sua política em relação a Gaza, além de evitar coisas como apresentar um endosso como “apoio crítico”, etc. Eu não tentaria maquiar a situação fazendo parecer que Biden é ótimo, ou bom, ou que somos tão sortudos por tê-lo, como alguns políticos progressistas têm feito.

Mas ao contrário do DSA, parece que Shawn Fain e camaradas na UAW chegaram à compreensível conclusão de que o que seu sindicato diz este ano terá um grande impacto no resultado da eleição, especialmente em estados-chave como Michigan. Acho que sua lógica é compreensível e, se estivesse em seu lugar, teria dificuldade em não chegar a uma conclusão semelhante.

O que o DSA enquanto DSA Deve Fazer em Relação à Eleição?

Para o DSA enquanto DSA, é possível que a organização se abstenha de fazer uma recomendação sobre como votar ou adote uma posição mais ambígua como “vote contra Trump” no outono. Independentemente do que o DSA eventualmente decida fazer, o fato é que a organização não precisa decidir agora. Não há mundo em que o DSA faria uma campanha séria para Biden, então não estamos sob pressão para agir rapidamente. Podemos esperar para ver como a Convenção Nacional Democrata se desenrola — e ver se Biden é realmente o indicado no final (os relatos crescentes sobre sua saúde debilitada me fazem pensar que uma decisão de última hora de se afastar é totalmente possível).

Até chegar o momento da convenção, há tarefas muito mais urgentes diante de nós — tanto para ajudar a encerrar a ofensiva genocida de Israel na Palestina quanto para impedir que Trump vença. Podemos intervir nas eleições em curso para nos aproximarmos de alcançar ambos os resultados.

Precisamos:

  • Lutar com unhas e dentes para convencer os Democratas a mudarem de rumo na Palestina. Não porque tenhamos ilusões de que possam “recuperar princípios progressistas” ou se redimir de sua posição até agora. Mas porque queremos ver o genocídio encerrado e Trump derrotado. Isso exigirá que a gente persiga os Democratas em todos os níveis exigindo que apoiem um cessar-fogo e rejeitem o financiamento da AIPAC e da J Street, etc. Precisamos ir a comícios e manifestações em nossas cidades e vilarejos. Se Biden estiver realizando um evento de campanha ou angariando fundos, deveria haver um piquete ou desobediência civil. Se o seu congressista for ruim como o meu, adote táticas de grupos como o NY-10 Neighbors (grupo de moradores do 10º Distrito de votação em Nova York que pressionam o Deputado Dan Goldman a apoiar o Cessar-Fogo Permanente na Palestina). Eles reúnem membros do DSA e outros ativistas e estão lutando para fazer os parlamentares Democratas no Congresso apoiarem um cessar-fogo. Realmente não sabemos o que funcionará, então devemos estar abertos a várias táticas diferentes. Se você é um ativista sindical, acho que fazer o argumento para adiar um endosso presidencial pelo maior tempo possível também é uma boa ideia. Em disputas não-presidenciais, também pode fazer sentido argumentar por negar endossos sindicais e de organizações comunitárias a qualquer candidato que apoie o genocídio.
  • Pressionar Biden a desistir. Biden não será o candidato oficial do Partido Democrata até a Convenção Nacional Democrata em Chicago no final de agosto. A esquerda deveria defender a demanda de que ele desista. Seria um golpe enorme para a fração pró-Israel do Partido Democrata se Biden fosse forçado a desistir por causa de seu papel em permitir o genocídio em Gaza. (Pense no efeito duradouro que a desistência de LBJ em 1968 teve sobre as forças pró-Guerra do Vietnã dentro do Partido Democrata) Além disso, fazer com que Biden desista provavelmente é a melhor chance que temos de derrotar Trump no outono. Nesse sentido, o esforço em Michigan liderado pela irmã mais nova de Rashida Tlaib, Layla Elabed, para fazer com que os eleitores democratas de Michigan votem “indecisos” na primária presidencial em 27 de fevereiro vale a pena ser apoiado. Talvez isso possa ser copiado em outros estados também.
  • Defender a esquerda pró-Palestina no Congresso. Os parlamentares do The Squad (nome informal pelo qual tem sido chamado os seguintes 8 parlamentares: Rashida Tlaib of Michigan; Cori Bush of Missouri; Alexandria Ocasio-Cortez and Jamaal Bowman of New York; Ilhan Omar of Minnesota; Ayanna Pressley of Massachusetts; Greg Casar of Texas and Summer Lee of Pennsylvania.) têm sido os maiores defensores da Palestina na política nacional e é importante cerrar fileiras com eles durante este momento. Alguns deles têm sérios desafiantes nas primárias. Devemos fazer o que pudermos para defendê-los, doando dinheiro e nos voluntariando, se pudermos. Isso significa fazer nossa parte para defender Rashida, é claro, mas também os outros.
  • Construir a esquerda e o movimento dos trabalhadores. Já foi dito pelos socialistas muitas vezes antes, mas é verdade: a resposta mais forte à ameaça da extrema-direita e aos crimes de guerra de Israel é uma esquerda ousada e independente e um movimento dos trabalhadores revigorado. Em 2024, construir a esquerda e o movimento  dos trabalhadores significa:
    • Fazer campanha e impulsionar tribunos socialistas que estão concorrendo a cargos e trabalhando nas legislaturas para defender nossas políticas — especialmente camaradas como JP Lyninger em Louisville, a chapa de socialistas democráticos de Nova York, Jesse Brown em Indianápolis, Richie Floyd em St. Petersburg e outros.
    • Ajudar a liderar esforços realmente fortes de solidariedade para apoiar lutas contratuais e novas campanhas de organização em uma série de lutas sindicais que estão por vir este ano, desde a pressão da UAW para organizar os não-organizados no setor automobilístico até as lutas contratuais para trabalhadores dos correios, professores e mais.
    • Construir os projetos que colocarão o movimento sindical em uma nova trajetória mais militante, de esquerda e democrática: o Rank and File Project, o novo projeto de Organização de Trabalhadores por Trabalhadores da Comissão Nacional de Trabalho do DSA, Labor Notes, o Comitê de Organização Emergencial no Local de Trabalho, e mais.
    • Amarrar todo esse trabalho com o que está na mente de todos na esquerda progressista: “Como realmente derrotamos o trumpismo?” Ninguém deve ter ilusões: o DSA odeia a extrema-direita e faremos tudo o que pudermos para contribuir significativamente para derrotá-lo e avançar com a tarefa de construir um mundo melhor.

O futuro da Palestina e as vidas de milhões de pessoas inocentes estão em jogo em 2024. Assim como o que Lenin chamou de “luz e ar” necessários para fazer política em massa: direitos democráticos, trabalhistas e civis. A esquerda e o DSA têm a responsabilidade de trabalhar como nunca agora para parar o genocídio, fortalecer as forças da pró-Palestina nos EUA e empurrar Biden para fora da corrida presidencial. E então, no outono, podemos revisitar a questão de quais devem ser as táticas do DSA na eleição geral.


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Pedro Micussi