Todas as táticas para derrotar Bolsonaro – e uma estratégia por um Brasil dos trabalhadores e do povo
Foto: Pedro Feltrin Batista.

Todas as táticas para derrotar Bolsonaro – e uma estratégia por um Brasil dos trabalhadores e do povo

Roberto Robaina analisa a situação política brasileira e as tarefas dos socialistas.

Roberto Robaina 6 ago 2021, 19:42

Para ir direto ao ponto, na atual situação política brasileira, há três objetivos fundamentais que devem ser postos para o movimento socialista: 1) derrotar, pela via que seja, o presidente Jair Bolsonaro; 2) defender as liberdades democráticas, os direitos econômicos e sociais dos trabalhadores e do povo; 3) formular, desenvolver e lutar por propostas que apontem uma saída para a crise do ponto de vista dos interesses dos explorados e oprimidos.

Desses três objetivos não contraditórios entre si, derivam-se táticas e orientações estratégicas, cada uma delas cuja especificidade responde, na mesma ordem, aos objetivos definidos, orientações que não apenas são complementares mas se fortalecem mutuamente e fortalecem a luta pelos três objetivos: a) a tática da unidade de ação; b) a tática da frente única; c) a estratégia da construção de um corpo político revolucionário independente.

No Brasil atual, a tática da unidade de ação, amplamente utilizada em todas as lutas importantes ao longo da história, principalmente contra regimes e governos autoritários e ditatoriais, é fundamental para que se imponha a derrota ao governo Bolsonaro. Sua importância deriva do fato de que o projeto de Bolsonaro é contrarrevolucionário de extrema direita, cuja realização implica ataque às liberdades democráticas, à liberdade de imprensa, de organização, de reunião, e, no caso concreto brasileiro, recentemente, na deslegitimação das eleições. Esse projeto de Bolsonaro despertou a oposição em todas as classes sociais. A própria classe dominante está dividida. Basta como exemplo a decisão de investigar Bolsonaro tomada pelos ministros do STF e do TSE.

Unir na ação concreta ao redor deste ponto programático, isto é, de defesa das liberdades democráticas e, de preferência, pela bandeira do Fora Bolsonaro, é o que definimos como aplicação da tática da unidade de ação, que passa pela realização de atos, passeatas, pronunciamentos e manifestos, com todos que compartilhem desse objetivo. A unidade de ação não é uma tática para as eleições, mas para a luta cotidiana, mas pode ser também estendida ao terreno eleitoral se, num segundo turno, por exemplo, enfrentam-se Bolsonaro e outro candidato que tenha sido e seja seu oponente. A unidade, neste caso, se expressaria na defesa do voto anti-Bolsonaro. A tática da unidade de ação, entretanto, está longe de esgotar a orientação do movimento socialista. Limitar-se a ela seria confiar que as classes sociais têm o mesmo interesse e que a burguesia liberal é consequente na luta contra o fascismo. Os trabalhadores devem ser conscientes de que a continuidade do poder burguês significa uma constante ameaça aos seus interesses.

A tática da frente única, formalizada pela primeira vez em junho de 1921, no terceiro Congresso da Internacional Comunista, não abandona os objetivos da unidade de ação, mas constrói uma delimitação superior em conteúdo e método. Busca unir os partidos que se postulam como partidos de classe, dos trabalhadores, e as organizações sociais do movimento de massas para se opor à ofensiva patronal, seja aos ataques do fascismo, seja aos ataques contra os direitos sociais e econômicos dos trabalhadores levados adiante pelos capitalistas e seus governos. Trata-se de um acordo cujo objetivo é somar forças para impor derrotas aos planos capitalistas e fortalecer bandeiras de classe dos setores explorados e oprimidos. Tal tática não esgota, tampouco, a orientação do movimento socialista. Entre as organizações e partidos que reivindicam a classe trabalhadora há programas e estratégias diferentes e até opostas. O movimento dos trabalhadores se dividiu historicamente em posições revolucionárias, cuja estratégia é a destruição do capitalismo e a construção de um estado de novo tipo, uma nova institucionalidade baseada na auto-organização do movimento de massas, e as posições reformistas, cuja estratégia é atenuar as contradições de classe, buscando melhorias para os trabalhadores, mas num regime e num modo de produção burguês. Pois a tática de frente é a busca de acordo entre forças revolucionárias e reformistas que atuam no movimento de massas.

A importância desta unidade para fortalecer a capacidade de luta dos trabalhadores é evidente, mas não menos evidente são os limites dessa tática, já que os reformistas são contrários a uma estratégia de ruptura com a burguesia, como concretamente os 13 anos de governos do PT demonstraram. Assim, a tática da frente única não pode implicar acordo para realizar um governo comum entre revolucionários e reformistas, pela simples razão de que os revolucionários, neste caso, estariam abrindo mão de seu programa ao aceitarem a hegemonia de um programa que não rompe com o capitalismo. Ao longo da história, tivemos muitos exemplos dessa capitulação, não tendo registro experiências opostas, em que os revolucionários tenham sido apoiados por aparatos reformistas em sua estratégia de revolução social. Se não é uma tática por um governo comum,  quer dizer que tampouco é uma tática e um acordo para as eleições. Mas a frente única pode também se estender ao terreno eleitoral. Tal opção deve ser feita em pelo menos dois casos:  se há real ameaça de a candidatura da extrema direita vencer a eleição e se há uma ameaça real de um candidato da burguesia liberal ser o principal opositor contra a extrema direita, em detrimento de um candidato das forças reformistas. Neste caso, o chamado ao voto e a participação na campanha não devem implicar compromisso de governo. 

Em relação à tática da frente única, além do seu conteúdo econômico e social de classe, agrega-se um método de luta mais claro, de combate permanente, que pode e deve incluir a necessidade de impulsionar a autodefesa dos partidos e das organizações, entidades sindicais, populares, camponesas, estudantis e dos direitos civis em geral. No Brasil, aliás, essa tarefa deve ser posta na ordem do dia, o que não tem sido discutido com a urgência que merece. A discussão tem se resumido ao terreno eleitoral. A via eleitoral é um caminho visível para se derrotar Bolsonaro. E tal acordo é simples de ser feito numa eleição em dois turnos, seja apelando para a tática de unidade de ação, seja preferencialmente pela via do apoio a um candidato que integre os partidos que construam a frente única. Mas um compromisso eleitoral está longe de garantir a eficácia da frente única. A capacidade de organização e de luta nas ruas de cada classe social é o decisivo para o futuro do país. 

Não é por acaso que a terceira tarefa é denominada estratégica. A construção de um corpo político revolucionário que impulsione a mobilização e a luta pelo poder dos trabalhadores e do povo pobre é a única saída de fundo para a crise nacional. O capitalismo é derrotado ou teremos sempre as forças da barbárie ganhando terreno tendencialmente, acompanhadas pela ameaça recorrente do fascismo. A denominação mais conhecida deste corpo político é a de partido político, embora a forma partido esteja desgastada por conta da identificação quase exclusiva entre partido e eleições, tarefa fundamental mas que não resume a atuação de um corpo revolucionário digno deste nome. Hoje, os revolucionários são uma minoria. Esta razão não nos isenta da necessidade de construir este corpo e se apresentar de modo claro, com bandeiras próprias ao movimento de massas. Somente se postulando, desenvolvendo as táticas necessárias para fortalecer as lutas democráticas, econômicas e sociais que respondem aos interesses dos trabalhadores e dos setores oprimidos, atuando como operador dessas lutas, se pode construir um polo consciente, capaz de agrupar as parcelas mais avançadas do povo trabalhador. Este desafio é o que permite fortalecer as tendências da revolução e derrotar de modo definitivo a contrarrevolução e seus representantes de hoje e de amanhã.


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