Lutar contra uma nova “Nakba” no século XXI

Lutar contra uma nova “Nakba” no século XXI

4 de novembro, dia mundial de solidariedade: cessar-fogo imediato, ajuda humanitária e isolar o Estado de Israel

Israel Dutra 2 nov 2023, 17:06

Por céu, terra e mar, as forças de Israel buscam asfixiar o apoio humanitário, destruir a infraestrutura hospitalar e cortar a eletricidade em Gaza, além de consolidar o cerco dos colonos à Cisjordânia. Estamos diante de uma ofensiva que não tem outro objetivo senão impor uma nova “Nakba” – os falcões do Estado de Israel já falam em “evacuar” milhões para o Sinai.

O alto comissariado da ONU declarou que os bombardeios contra o campo de Jaballia são crimes de guerra. Na quarta-feira, a porta-voz do secretário-geral da ONU disse que um funcionário de alto cargo do Escritório dos Direitos Humanos das Nações Unidas se demitiu por causa do que chamou de “fracasso da ONU na Palestina”. A resposta do movimento global de solidariedade é a manifestação mundial prevista para o dia 4 de novembro. Estamos convocando e organizando, por todo lado, esse dia internacional de protestos, que pode ser um ponto de virada central para evitar o prosseguimento do genocídio.

Chamar as coisas pelo nome: genocídio

Não há outro nome para qualificar a operação de Israel na Faixa de Gaza e na Cisjordânia que não genocídio. O plano de Israel é conduzir esse genocídio, por meio de uma guerra total, até obter uma ocupação política e militar em Gaza e a recolonização completa da Cisjordânia, concluindo um deslocamento de 2 milhões de palestinos para fora de seu atual território.

As fontes militares israelenses e o ministério da inteligência vazaram documentos que “recomendam” o remanejamento dos 2,2 milhões de palestinos de Gaza para o Sinai após a guerra. O Egito informou que não aceitará a migração forçada da população. A Península do Sinai fica entre a Ásia e a África, tendo sido ocupada na Guerra dos Seis Dias em 1967,  juntamente com a Faixa de Gaza, Cisjordânia, Jerusalém Oriental e as Colinas de Golã. A Península foi retomada na guerra do Yom Kipur, sendo reconhecida como parte do Egito, pelo Estado de Israel, em 1979.

O que Israel está tentando fazer é uma nova “Nakba”. Esse termo, em livre tradução, a “catástrofe” é a base da limpeza étnica da região, quando 710 mil árabes palestinos foram expulsos de seus lares. Quase um milhão tiveram seus lares destruídos, na Palestina sob mandato britânico, sendo essa a base que assentou o Estado de Israel. A resolução da ONU que previa um acordo equitativo e justo para o retorno dos refugiados nunca foi cumprido.

O resto da história é sabido. A nova escalada de Netanyahu, apoiada pelos Estados Unidos e pela maior parte das frações de suas elites dominantes, como Biden e Trump, unindo Democratas e Republicanos, é a tentativa de começar essa nova “Nakba”, no maior projeto militar de migração forçada dos tempos modernos.

Quanto mais avança a barbárie, mais se radicalizam os organismos multilaterais: a atuação dos Médicos sem Fronteiras, exemplar, denunciou em nota oficial que a “violência indiscriminada e a punição coletiva em Gaza devem cessar”.  A Unicef denunciou a morte de quase 4 mil crianças, dentro dos quase 10 mil palestinos mortos desde o dia 7 de outubro. O Papa Francisco utilizou as redes sociais para pedir o cessar-fogo imediato. A Anistia Internacional denunciou o uso de munição ilegal, de fósforo branco, por parte de Israel, na fronteira com Líbano. A ação de Israel pode resultar num novo tipo de fascismo, com uma forma superior de limpeza étnica, tendo implicações para o povo palestino, para o mundo árabe, e para toda a humanidade. É possível impedir a nova “Nakba”.

É possível deter a ofensiva

O massacre em curso terá desdobramentos: trata-se de uma encruzilhada histórica. O Estado de Israel, apoiado pelos Estados Unidos, desconsiderou as resoluções da ONU, isolando-se na esfera diplomática. Após a falência das votações da ONU, vários chefes de Estado romperam relações diplomáticas com Israel e outros, como a Turquia e a Jordânia, a primeira um membro da OTAN e a última uma parceira estratégica histórica de Israel no Oriente Médio, mandaram retornar seus diplomatas de Tel Aviv.

O movimento de massas, por sua vez, está respondendo da forma que pode, unificando, essencialmente, três setores da resistência à ofensiva:

a)       as massas árabes, combinando as manifestações em todos os países; a ação militar de países e a resistência organizada, inclusive do ponto de vista militar, na Palestina;

b)      as manifestações nos países centrais, que envolvem a luta heroica dos judeus antissionistas no coração dos Estados Unidos, com lutas em Nova York, Washigton e nas universidades como destaque. As centenas de milhares em Londres e em outras capitais da Europa e a desobediência dos subúrbios franceses às leis draconianas de Macron fazem da causa palestina uma luta dos imigrantes do mundo;

c)       no chamado “Sul Global”, os setores combativos, comprometidos historicamente com a luta palestina e com tradição anti-imperialista, com importância na América Latina. Os governos de Bolívia e Colômbia estão dando um exemplo, arrastando Boric do Chile, retirando os embaixadores e indicando a ruptura diplomática e o isolamento do Estado de Israel.

Haveria ainda mais exemplos a mencionar, como o dos sindicatos belgas, que orientaram aos trabalhadores a não descarregarem nos aeroportos as armas que chegam para a ofensiva israelense, denunciando os crimes de guerra. A última palavra está por ser dada. As manifestações do dia 4, primeira iniciativa mundial centralizada (já se discutem novas manifestações em 29 de novembro, calendário histórico) serão um novo passo. É preciso romper o cerco a Gaza e pressionar os governos a tomarem posições.

O governo brasileiro precisa romper relações com Israel para parar o genocídio

O governo brasileiro ganhou autoridade diante da ONU ao encabeçar uma resolução que deixou Israel e os Estados Unidos em nível maior de isolamento. Trata-se, no entanto, de uma ação bastante insuficiente.

É preciso lutar para que se dê um passo adiante: vários setores de esquerda tem apresentado a necessidade da ruptura de relações diplomáticas com Israel, até mesmo em agrupamentos mais sintonizados com núcleo do governo. Ana Prestes, especialista em relações internacionais e dirigente do PCdoB, por exemplo, afirmou “Lula faria mais pela paz e pelo futuro da humanidade hoje ao condenar firmemente as atrocidades que ocorrem em Gaza sob os olhos de todos, romper ou no mínimo congelar os acordos bilaterais com Israel e coordenar internacionalmente um isolamento do Estado colonial e genocida de Israel”.

As manifestações pelo país têm ganhado força e é possível haver um salto na mobilização no próximo dia 4. O manifesto de intelectuais da USP, por sua vez, mostra que o consenso midiático em favor do sionismo pode ser rompido. É hora de unir forças em solidariedade ao povo palestino pelo cessar fogo imediato! Basta de crimes de guerra e de genocídio em Gaza! Ruptura das relações diplomáticas com Israel!

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