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Questões olímpicas

As Olimpíadas de Paris trouxeram importantes elementos da situação política

Israel Dutra 12 ago 2024, 18:33

Foto: Ana Patrícia e Duda, medalhistas brasileiras no vôlei de praia (Michael Reaves/Getty Images)

O maior evento esportivo mundial chamou a atenção dos olhares do mundo, na sua 33ª edição na sua fase moderna, em Paris 2024.

Impossível não vibrar com nossas vitórias, como a de Bia Ferreira no judô contra uma adversária sionista, a favor das IDF israelenses; com o brilho de Rebeca Andrade, ouro na ginástica olímpica; ou com a despedida de Marta, ídola de toda uma geração do futebol feminino.

Os temas políticos centrais da situação internacional tiveram lugar durante os jogos. O próprio palco da competição, a França, é parte central da crise política, onde se conjugam a debilidade do governo Macron, a sanha da extrema-direita e a recente vitória eleitoral da Nova Frente Popular.

A outra discussão central, não menos estratégica, envolve a condição do próprio esporte brasileiro, como base para um projeto mais geral.

Além disso, recomendamos a escuta da nova edição do “Podcast Em Movimento” onde Julia Maia entrevista o Matheus Oliveira, da Unicamp, especialista no tema.

Imagens da situação política

Desde a abertura ao encerramento, os Jogos Olímpicos de Paris tiveram momentos simbólicos e discussões políticas acaloradas. Já na largada, os conservadores reclamaram da representação da Santa Ceia da diversidade, apelando para um discurso desonesto e autoritário. A delegação argelina fez homenagem aos seus compatriotas assassinados em 1961, na mesma Paris, no massacre promovido no auge do colonialismo francês.

Macron, como já citado, utilizou os jogos para tentar limpar sua imagem. Foram retirados 12 mil moradores das ruas de Paris; Macron fez o discurso ufanista, apesar das inúmeras mostras de fragilidade e desaprovação popular que teve nos últimos meses.

Do ponto de vista mais amplo, três acontecimentos marcaram a imagem política das olímpiadas:

  • A presença constante da causa Palestina, com sua delegação fazendo menção ao primeiro porta-bandeiras com a homenagem a Majed Abu Maraheel – primeiro atleta a levar a bandeira da Palestina aos jogos, em 1996 -, morto em Gaza, durante o presente massacre.
  • A boxeadora argelina Imane Khalife foi alvo de ataques nas redes sociais, replicados inclusive por Trump. A resposta contra os ataques transfóbicos foi a conquista da medalha de ouro.
  • A primeira medalha oficial da seleção de refugiados, no boxe feminino. Cindy Ngamba, camaronesa que vive na Inglaterra, entrou para a história, justamente na semana em que explodiu a violência xenófoba no Reino Unido.

As contradições da situação política mundial apareceram com força no decorrer dos jogos olímpicos. No caso do Brasil, as vitórias celebradas não deixam de levar a uma reflexão maior sobre o lugar do esporte no país.

A questão do esporte como base para um projeto nacional e coletivo

Lula assinou uma MP para isentar os medalhistas de tributos na premiação recebida em Jogos Olímpicos e paraolímpicos. O simpático gesto é insuficiente. Seja porque a questão tributária no Brasil segue dominada pela agenda dos mais ricos, seja porque o esporte precisa de muito mais que medidas cosméticas.

Essa medida passa longe das reais necessidades do esporte. Precisa de mais investimento, orçamento e articulação. O esporte no Brasil está aquém: vide o desmonte durante os anos Bolsonaro, quando acabou com o Ministério do Esporte. No atual governo, Lula negociou com o centrão, retirando da pasta uma ex-atleta séria e comprometida como Ana Moser.

O investimento no esporte – seja no de alto rendimento, seja no esporte como base educacional – é estratégico e não pode ficar apenas a cargo de clubes privados ou dos militares. A maior parte do investimento deve ser pública, articulada com o conjunto do sistema escolar, com a disposição de equipamentos públicos. Isso vale para ampliar a participação em esportes olímpicos e paraolímpicos.

A austeridade fiscal é hoje a principal ameaça, como explicou bem David Deccache:

Desde 2015, as medidas de austeridade fiscal têm cortado drasticamente esses investimentos. A queda contínua nos valores liquidados retorna aos patamares preocupantes do início dos anos 2000, o que coloca em sério risco o futuro do Brasil em competições internacionais como os Jogos Olímpicos.

Os dados são claros: os aumentos nos investimentos tiveram um impacto direto e positivo no desempenho esportivo do Brasil, tanto em termos de número de medalhas quanto na diversificação das modalidades premiadas. Se mantidas, as políticas de austeridade ameaçam desmantelar os avanços conquistados na última década.

Como base de um projeto nacional, precisa prevalecer a visão do esporte como cooperação a serviço do desenvolvimento humano e coletivo, da maioria do povo.

A falta de um projeto

A falta de um projeto para o esporte, é apenas uma das expressões da falta de projeto nacional, onde a burguesia brasileira, adensada por um estado ampliado, não busca as condições mínimas para promover reformas estruturais. Isso se aprofundou ao longo das últimas décadas marcadas por: decadência, regressão e desindustrialização.

Só vamos ter condições de romper esse círculo vicioso, rompendo com o modelo rentista; em outras palavras, começando por acabar com a austeridade fiscal, vinculando pesados investimentos no esporte- assim como na educação, saúde e outras áreas ditas sociais.

Devemos defender essa bandeira, contra o neoliberalismo e sua expressão concreta (o arcabouço fiscal), nas lutas em curso e nas propostas eleitorais que o PSOL levará para o pleito em outubro.

Sair do paraíso do rentismo, da política capturada por uma casta para um projeto mais geral é o único caminho para o esporte brasileiro, uma ruptura, a favor da maioria social, para liberar a energia e a potência de um outro futuro.


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Pedro Micussi