Novo congresso toma posse: A luta recém começa

Uma análise da posse do novo Congresso e das eleições para presidente da Câmara e do Senado.

Bernardo Corrêa e Israel Dutra 5 fev 2019, 09:28

Acabamos de assistir a posse de novos deputados e senadores, juntamente com a eleição para a presidência das duas casas legislativas. O processo político marcou uma significativa vitória de Rodrigo Maia para a chefia da Câmara dos deputados e a de Davi Alcolumbre no Senado. O governo, que vinha de um começo acidentado logra nas Câmaras apoio para sua agenda que exige toda a burguesia: a reforma da previdência que, em síntese, pretende reduzir o déficit público por meio da usurpação do salário do trabalhador. O governo se fortalece para aprovar sua agenda econômica, entretanto, a pauta ideológica encontra mais contradições.

Mediante a conformação desta frente em defesa dos interesses burgueses, nossa política foi de conformar um pólo democrático. O PSOL levantando a candidatura de Marcelo Freixo atuou corretamente para a conformação do bloco, tomando a iniciativa de fortalecer uma oposição fiel à luta do #EleNão de forma ampla, sem sectarismo, com firmeza programática. Os 50 votos obtidos por Freixo são poucos para ganhar votações no congresso, mas são muitos para mostrar ao povo o que são estas reformas do governo Bolsonaro e Guedes. Oferecer projetos de  leis alternativos e levá-los às organizações sociais, às fábricas, escolas e bairros para que o povo veja que há uma alternativa concreta aos planos do governo.

Foi importante que parte da bancada do PT apoiou essa posição votando em Freixo e parlamentares da Rede e do PSB também o fizeram. Mesmo sabendo das importantes diferenças e críticas que o PSOL tem ao PT e seus governos, e que não desaparecem com a unidade do bloco, isso foi possível porque o debate não se restringiu  às quatro paredes do parlamento. E, definitivamente, marca uma nova responsabilidade para o PSOL frente às tarefas da resistência. A tarefa é manter e ampliar o bloco de oposição para encarar os ataques do governo. 

O PSOL tem como tarefa ajudar a esclarecer ao povo o significado da reforma em todos os meios possíveis. Nossos parlamentares devem atuar como tribunos do povo e dos trabalhadores, nos locais de trabalho, estudo e moradia apresentando uma saída para reduzir o déficit fiscal por meio da auditoria da dívida pública, de uma revolução tributária e medidas que façam com que os que ganhem mais paguem mais e, assim que os ricos que produziram a crise paguem por ela. 

No país onde seis pessoas concentram riquezas de 100 milhões de brasileiros, não pode ser o trabalhador o penalizado pela crise fiscal. Via desvinculação das receitas da União, as verbas destinadas à previdência social vêm sendo permanentemente vilipendiadas, tudo para garantir o pagamento dos juros da dívida pública e a remuneração injusta do capital financeiro. Além disso, ao contrário do que diz o governo e seus aliados, é sabido que os verdadeiros privilégios da previdência concentram-se nos militares, juízes e políticos.

O caso de Brumadinho revela quais são as consequências desta política. Desde a privatização da Vale e a sucessivas isenções fiscais concedidas à mineradora a fiscalização sobre seus crime ambientais foi cada vez menor e a impunidade de Mariana favoreceu que um desastre ainda maior. Por isso, a exigência de justiça para o crime de Brumadinho é também uma denúncia da ideologia do Estado mínimo. 

O governo, apesar de colocar seus aliados à frente das duas casas do Congresso Nacional, precisa se estabilizar com seu plano de reformas. No país que discute as causas e as consequências da maior tragédia ambiental de sua história, o crime da Vale em Brumadinho, a novidade que traz esperanças neste cenário foi a presença marcante do PSOL, com Marcelo Freixo a frente, estendendo uma ponte entre a luta parlamentar e as demandas das ruas e dos movimentos sociais.

Eleições da Câmara e do Senado: a necessidade de uma oposição de verdade

Com 334 votos, sem necessitar de segundo turno, Rodrigo Maia ganhou com folga a disputa pela presidência da câmara. Os outros candidatos, com pouca expressão, ainda assim perfilaram um retrato da atual composição do parlamento: no campo da extrema-direita, houve a adesão segura a Maia, e Marcel Van Hatten (NOVO-RS) representou os interesses do campo do MBL, em parceria com Kim Kataguiri, chegando a 23 votos; o General Peternelli (PSL-SP) teve dois votos e nenhum destaque; candidatos como Fábio Ramalho, que fechou a bancada mineira (66 votos), Ricardo Barros (4 votos) e mesmo JHC (30 votos), jovem ligado à oligarquia alagoana que apareceu como saída para a profusão de interesses que o PSB se viu enredado.

O endosso que partidos como o PCdoB e PDT, parte da oposição ao governo, fizeram à candidatura Maia, inclusive se utilizando de uma manobra regimental para reter a liderança da minoria na Casa, foi um grave erro. O centro de sua tática foi ganhar postos no parlamento, como forma de se defender do crescimento da direita, mas objetivamente fortaleceu o bloco em torno de Maia e dos interesses do governo. Atuaram deliberadamente para que a oposição encabeçada pelo PSOL não fosse a principal minoria, hipotecando a oposição de verdade a partidos que mantêm posição dúbia acerca dos planos de Bolsonaro. 

A candidatura de Marcelo Freixo, com seus 50 votos, maior votação que o PSOL teve na disputa do congresso em sua história, foi um contraponto real às articulações palacianas de Maia e da casta política e uma mudança na responsabilidade do partido frente à oposição nas ruas. A consolidação de um bloco de oposição, composto por PSOL, PT, Rede e PSB foi uma vitória da resistência. Na eleição para a presidência do Senado, os bolsonaristas utilizaram-se de um sentimento democrático na população de ‘Fora Renan’ e em defesa do voto aberto para ter mais incidência na casa para a aprovação de sua agenda. 

Diferentemente da Câmara, no Senado primou a ausência de qualquer alternativa. Em meio à disputa polarizada entre o muito ruim e o pior, não houve uma oposição que pudesse disputar o imaginário popular que acompanhava (como nunca em nossa história) o que acontecia ao vivo. A postura absolutamente lamentável de Randolfe e o silêncio de outros parlamentares da oposição mostra, pela negativa, a importância do PSOL e do bloco de Oposição nas ruas e no parlamento, na situação política em que vivemos.

Os mandatos socialistas e as tarefas do presente

Tal qual nos Estados Unidos governados por Trump, onde fenômenos como o DSA de Julia Salazar e a eleição de Alexandria Ocasio-Cortez renovam as esperanças e a combatividade da esquerda, no Brasil se fortalece uma oposição socialista para enfrentar os desmandos de Bolsonaro. O feminismo combativo das 99% expressos nos mandatos de Sâmia Bomfim, Fernanda Melchionna, Talíria Petrone e Áurea Carolina, a chegada de David Miranda, negro, favelado e LGBT, somados à experiência do conjunto da bancada do PSOL fortalecem esta perspectiva. 

Como primeira tarefa já esboçada aqui, organizar pela base o combate à reforma da previdência, estabelecer relações a ajudar na organização dos sindicatos para uma Frente Nacional contra Reforma da Previdência. Como segunda tarefa, devemos construir um “Março Marielle” que começa no carnaval com o desfile da Mangueira que vai trazer o tema à Sapucaí, segue na construção de um grande 8M e, em seguida uma manifestação internacional por Justiça para Marielle no 14M, data que completa um ano de seu brutal assassinato político. 

Por último, há um tema que devemos tomar com força que é o tema de Brumadinho. Ele revela as consequências da política de subordinação do Estado aos interesses das grandes empresas. Devemos exigir justiça às famílias e a reestatização da Vale, assim como rever qualquer isenção fiscal a mineradoras que cometam crimes ambientais de qualquer ordem. Esta é uma luta que combina as dimensões econômicas, humanitárias e ecológicas da crise atual e deve ser desenvolvida nos próximos dias. Nesta luta que recém começa temos um calendário cheio e um espaço político a ocupar.


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Pedro Micussi