Das calúnias de Stalin às calúnias de Putin
Ukraine flag in Kyiv.

Das calúnias de Stalin às calúnias de Putin

“Putin calunia um povo inteiro: “A Ucrânia é nazista”. Desde Zelensky até o último trabalhador da linha de frente hoje defendendo seu país. E é uma batalha na qual, infelizmente, Putin está vencendo por goleada”.

Alfons Bech 2 mar 2023, 14:56

Via Aporrea

“Não estou preocupado com o grito dos violentos, dos corruptos,!dos desonestos, dos antiéticos. O que mais me preocupa é o silêncio das pessoas boas.”

(Martin Luther King)

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No comício pela paz na Ucrânia no sábado 25 na Plaza Sant Jaume em Barcelona haviam 2.000 pessoas de acordo com a polícia municipal. Longe, longe, longe da grande manifestação contra a guerra do Iraque, vinte anos atrás. No dia anterior, 24 de fevereiro, aniversário do lançamento da guerra de Putin, havia 8.500 pessoas na Plaza Catalunya sob o slogan “Barcelona com Ucrânia”, a grande maioria deles ucranianos. Por que esta divisão? Por que havia tão poucos cidadãos diante de uma guerra tão cruel em território europeu?

O comício de sábado foi assistido por um grande grupo de cidadãos russos. Eles gritaram “Solidariedade com a Ucrânia”, “Putin Terrorista”. Uma parte do comício tentou cobrir suas vozes gritando “OTAN não, bases para fora”. Eles até os vaiaram, dizendo “Nazistas, nazistas!” Estas são coisas que a mídia deveria explicar a fim de entender melhor o que está acontecendo.

A dura luta pela verdade

Diz-se que a primeira vítima a cair em uma guerra é a verdade. Mas há um tipo particular de mentira que dói tanto ou mais do que bombas, destruição física ou baixas. É a calúnia de um povo inteiro: “A Ucrânia é um nazista”. Isto é o que Putin está fazendo ao povo ucraniano, desde Zelensky até o último trabalhador na linha de frente hoje defendendo seu país. E é uma batalha na qual, infelizmente, Putin está vencendo por uma goleada.

Nesta batalha, Putin tem colaboradores diretos. Há milhares deles, bem profissionais e bem pagos. Pessoas com a auréola de jornalistas neutros, intelectuais progressistas, ou generais de países ocidentais, blogueiros, influenciadores, políticos de partidos de direita, extrema-direita ou esquerda, e até mesmo alguns de ultra-esquerda. Todos eles já tinham uma posição pré-determinada a favor da Rússia antes de 24 de fevereiro de 2022.

Há também muitos milhares, milhões, de colaboradores indiretos. Eles repetem, amplificam e vulgarizam as calúnias fabricadas pelos profissionais.

No entanto, a parte mais numerosa da sociedade são as pessoas que se abstêm de tomar uma posição pública a favor da Ucrânia, a parte lesada. Em meio a tal confusão, é de se admirar que haja tão pouca resposta à solidariedade com a Ucrânia atacada?

Calúnia hoje e no tempo de Stalin

A calúnia sempre foi usada em lutas políticas, de poder. Mas foi Stalin que realmente lapidou e aperfeiçoou esta arma de destruição em massa. Seus efeitos foram fulminantes, desastrosos. Como um veneno inoculado no cérebro de pessoas simples e bem intencionadas. Durante os Processos de Moscou nos anos 30, revolucionários e camaradas de Stalin logo se tornaram “contra-revolucionários”. Muito poucos do Comitê Central do Partido Bolchevique da época de Lenin permaneceram vivos. E aqueles que não cometeram suicídio, concordaram em fazer terríveis “confissões”, culpando-se por todos os “crimes” de que Stalin os acusou.

Esta arma não foi usada apenas na Rússia. Graças ao poder de Stalin e ao aparato dos partidos comunistas stalinistas em todo o mundo, o método de calúnia foi estendido a todos os opositores das teses emanadas da diplomacia do Kremlin. Sabemos como Trotsky acabou sendo assassinado após anos de perseguição e calúnia. Mas, por uma questão de brevidade, gostaria de citar apenas um caso mais próximo de casa: o sequestro, tortura e assassinato de Andreu Nin, líder do POUM. Como Nin e seu partido lutaram para vencer Franco através de uma revolução social e não aceitaram a disciplina de Moscou de permanecer sob a liderança de uma república burguesa, foram acusados de serem “agentes do fascismo”. As pichações feitas pelos militantes do POUM após seu sequestro dizia: “Onde está Nin?” E a resposta dos stalinistas do PSUC foi: “Em Salamanca ou em Berlim”. Em outras palavras, com os fascistas ou com os nazistas.

A calúnia paralisa

O método sstalinista de difamar o adversário político se baseia em gerar dúvidas sobre sua integridade moral ou sobre suas intenções. Trata-se de uma falsa acusação feita com a intenção de levá-lo a um descrédito, por mais implausível que possa parecer. Não há necessidade de provar nada: apenas gerar desconfiança é suficiente. Quando em dúvida, é melhor não fazer nada: talvez eles sejam nazistas… Zelenski é um nazista? Todos os ucranianos são nazistas que querem acabar com os russos? O resultado prático desta dúvida é paralisia, desmoralização, confusão: “Eu não entendo mais nada, deixe-me em paz!”.

Esta calúnia afeta particularmente os sindicatos e as organizações de trabalhadores. A calúnia sobre o “nazismo” da Ucrânia está misturada com a defesa armada contra a guerra iniciada por Putin: como a Ucrânia pede tanques e aviões na OTAN? isso significaria que eles são nazistas!

Zelenski não é de modo algum o meu modelo. Ele forma um governo neoliberal que fez leis que atacam os trabalhadores. Como Rede Europeia de Solidariedade com a Ucrânia, ajudamos os sindicatos de lá a combatê-las. Eu também não sou a favor da OTAN; sempre a combati e acho que ela deve ser dissolvida quando obtivermos uma paz justa e duradoura. Na verdade, é Putin quem ajuda a fortalecer a OTAN! Mas… O que os ucranianos deveriam fazer, deixar-se invadir, aceitar um governo fantoche, aceitar que não têm o direito de existir como um Estado soberano e nenhuma cultura própria? “Desucranizarsem”, como dizem os ideólogos de Putin? E se querem resistir – como estão fazendo – a quem devem pedir armas? Quem lhes dá ou empresta armas? Ou não têm o direito de se defender como fizeram o Vietnã, Iraque, Argel, Panamá, Afeganistão? Por que não a Ucrânia? O direito de se defender se um país for atacado não faz parte dos direitos da ONU? A Assembleia da ONU deixou claro que a Rússia deve retirar suas tropas da Ucrânia! A calúnia confunde as leis internacionais, que são claras e transparentes.

A calúnia dificulta a solidariedade de classe.

Dentro dos sindicatos também há paralisia. Há debate, é verdade. Mas há confusão entre os membros. Quando e quem começou a guerra: 2014, 2022? Por quê? O que aconteceu no Donbas? Como agiu o governo ucraniano? Como agiu o governo russo?…. Mas acima de tudo, há um sentimento de impotência de que nada está sendo feito após um ano de guerra. Ao contrário de outros países, como França, Reino Unido, Polônia, Suíça…, onde os sindicatos já enviaram toneladas de ajuda e dinheiro para seus colegas sindicalistas ucranianos, na Catalunha e na Espanha não fizemos nada. Ou quase nada. Alguns líderes admitem privadamente que não compreendem a razão desta falta de solidariedade, desta paralisia.

Por que isso acontece? Uma razão é o desconhecimento quase completo da história e da realidade da Rússia, da Ucrânia, da Bielorrússia. Ignoramos o que são estas sociedades, suas relações internas, seus processos. Tendemos a acreditar em qualquer coisa de um chamado “especialista” ocidental ou de um jornalista que passou alguns anos em Moscou e nos conta histórias complicadas. Por outro lado, não lemos nada dos sindicatos de lá, nem de organizações de esquerda ou feministas. Não estamos interessados em procurar sua verdade… Nem prestamos muita atenção aos jornalistas que hoje arriscam sua integridade para explicar a verdade como a vêem, com olhos curiosos.

O peso da história da grande revolução bolchevique nada tem a ver com os magnatas que governam a Rússia de hoje: eles são seus coveiros. São eles que constroem a calúnia sobre a “Ucrânia nazista”. Recordemos as palavras de Martin Luther King e combatamos a calúnia insidiosa sobre o nazismo. O verdadeiro regime semi-nazista é o regime de Putin.


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