Imprensa europeia denuncia que Nestlé contribui com o desmatamento no Brasil
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Imprensa europeia denuncia que Nestlé contribui com o desmatamento no Brasil

Multinacional compraria colágeno oriundo de gado criado em zonas desflorestadas para fazer produtos antienvelhecimento

Tatiana Py Dutra 16 mar 2023, 13:30

Em fevereiro, o desmatamento na floresta amazônica chegou ao nível mais alto já registrado para o mês desde o início da série histórica. Conforme imagens de satélite, foram desmatados 322 quilômetros quadrados de floresta amazônica foi destruído em fevereiro, um aumento de 62% só em relação ao ano passado.

Se a revelação desses dados “passaram batido” no Brasil, causou alarme na Europa. O jornal britânico The Guardian publicou, no início do mês, reportagem denunciando a relação da pecuária com o desflorestamento, e mais: revelou a responsabilidade da multinacional suíça Nestlé nesse mercado da destruição.

De acordo com a apuração, a empresa é uma das principais compradoras de colágeno, proteína extraída da cartilagem do animal que promete retardar o envelhecimento da pele. Vendidos como suplementos alimentares, sob a marca Vital Proteins, os produtos são “um fenômeno de vendas”, comercializados em lojas e farmácias do Exterior por mais de 70 euros por quilo.

“As ligações entre a carne bovina, a soja e a desflorestação no Brasil são bem conhecidas, mas pouca atenção tem sido dispensada à florescente indústria do colagénio, estimada em cerca de US$ 4 milhões de dólares [3,7 mil milhões de euros]”, diz o artigo.

Cadeia internacional

A reportagem foi produzida por um consórcio de imprensa europeia (que além do The Guardian, inclui empreas como a rede televisiva britânica ITV) em parceria com o Centro para a Análise do Crime Climático. A apuração revelou que o abate de milhares de cabeças de gado, criadas em propriedades dentro do bioma amazônico e Cerrado,  servem à cadeia da carne, do qual a indústria do colágeno faz parte. 

Os jornalistas identificaram pelo menos 2,6 mil quilômetros quadrados de desmatamento associados à cadeia de abastecimento de duas empresas sediadas no Brasil e ligadas à norte-americana Darling Ingredients, fornecedora da Nestlé.

“Ainda não está claro o percentual exato de colagénio produzido no Brasil e destinado à Vital Proteins. O que se sabe é que a Nestlé, e sua marca Vital Proteins, compram colágeno da Darling Ingredients, cuja empresa no Brasil, a Rousselot, compra parte de sua matéria-prima da Marfrig [o segundo maior produtor de carnes do Brasil]”, afirma o artigo.

A Darling nega relação com empresas “que não atendem aos critérios de fornecimento responsável”. Já a Nestlé emitiu nota na qual promete entrar em contato com fornecedores para averiguar as alegações, e diz que trabalha para “garantir que até 2025 os seus produtos sejam livres de desflorestação”.

Nestlé e a água

Não é a primeira polêmica envolvendo a Nestlé e danos ao meio ambiente nacional. Em 2018, a multinacional vendeu sua operação de águas engarrafadas no Brasil (São Lourenço e Petrópolis) para o grupo nacional Edson Queiroz. O negócio foi fechado após anos de denúncias de que a empresa estaria exaurindo os mananciais da reserva de São Lourenço, no Parque das Águas, em Minas Gerais.

Em 2006, inclusive, movimentos sociais na região do Circuito das Águas conseguiram interromper a produção de água engarrafada Pure Life em São Lourenço. Mas não porque seus apelos sensibilizaram o governo brasileiro, mas a opinião pública suíça, alertada por reportagens e, até, por um pequeno documentário. A Nestlé se manifestou afirmando que tirava apenas 44% do total permitido dos mananciais de São Lourenço, prometeu estudos para comprovar, mas os resultados nunca foram divulgados. 

Durante o Fórum Mundial da Água, realizado em 2018, em Brasília, ONGs ambientais e movimentos sociais divulgaram o interesse da Nestlé na privatização de reservas de água brasileiras. Eles enviaram uma carta pública ao embaixador Manuel Sager, então diretor-geral da Agência Suíça para o Desenvolvimento e Cooperação (SDC), pedindo que a entidade trocasse o apoio a políticas de privatização pelo apoio a apoiar parcerias público-públicas, ajudando assim países mais pobres a desenvolverem as suas próprias empresas públicas de água.

Dada a repercussão internacional do caso, a Nestlé empresa precisou emitir nova nota, dessa vez, negando qualquer interesse de privatizar o acesso às fontes de água na América do Sul, especialmente, no que diz respeito ao Aquífero Guarani. E foi nesse contexto que a Nestlé anunciou subitamente a sua decisão de vender todas as suas marcas brasileiras de água engarrafada.

Desafio para Lula

O interesse de empresas nacionais e multinacionais em depredar o meio ambiente em nome do lucro é conhecido, mas casos como esses expõem um grande desafio que o governo Lula tem pela frente. Uma das promessas de campanha de Lula foi acabar com a extração ilegal de madeira, que foi recorde nos últimos 15 anos, sob o governo Jair Bolsonaro (PL).

Em seu discurso de posse, o presidente afirmou que “o Brasil não precisa desmatar para manter e ampliar sua estratégica fronteira agrícola”. Lula também destacou outras metas, como a busca por uma agropecuária e mineração mais sustentáveis por meio de uma transição energética e ecológica, bem como o estímulo ao reaproveitamento de pastagens degradadas.

São metas ambiciosas. Autoridades ambientais já avisaram que serão necessários anos para reduzir os danos ambientais gerados pelo desmatamento incentivados por Bolsonaro (PL), que abriu as portas das nossas florestas para saqueadores permanentemente à espreita.


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