Audiência defende mudanças no protocolo de Haia para brasileiras vítimas de violência no exterior
Audiência Mães de Haia

Audiência defende mudanças no protocolo de Haia para brasileiras vítimas de violência no exterior

Atividade liderada pela deputada Sâmia Bomfim expôs a realidade das mães que retornam ao seu país com seus filhos e são acusadas de sequestro

Redação da Revista Movimento 19 nov 2024, 11:26

Foto: Vinicius Loures/Câmara dos Deputados

Em uma audiência pública realizada na Câmara dos Deputados na última semana, especialistas e autoridades discutiram a necessidade de atualizar a legislação brasileira e internacional para proteger mães e crianças em situações de violência doméstica. A proposta visa evitar que mulheres que retornem ao Brasil com seus filhos, fugindo de agressões no exterior, sejam acusadas de sequestro internacional.

A audiência foi promovida pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, a pedido da deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP). A parlamentar destacou que a aplicação da Convenção de Haia de 1980 – ratificada pelo Brasil em 2000 – muitas vezes ignora os riscos enfrentados por mulheres migrantes. 

“Nos últimos 40 anos, a aplicação irrestrita desse tratado tem desconsiderado situações de violência doméstica contra mulheres brasileiras e seus filhos”, afirmou Sâmia, que defende a modernização do tratado.

Desafios enfrentados pelas vítimas

O tratado internacional estabelece que a retirada de menores de seu país de residência sem autorização de ambos os pais configura uma violação dos direitos da criança e da família, salvo em casos de grave risco físico ou psicológico. Contudo, a advogada Janaína Albuquerque, da organização Revibra Europa, alertou que a falta de critérios claros para identificar violência doméstica dificulta a defesa das vítimas.

“Cabe à mulher provar a violência, enfrentando barreiras como xenofobia, dificuldades financeiras e até o risco de ser criminalizada. Muitas perdem a guarda dos filhos, são multadas ou até presas”, explicou Janaína, enfatizando que o Brasil poderia liderar mudanças globais nesta área.

O procurador Boni Soares complementou a discussão, afirmando que o contexto histórico da Convenção de Haia, criada em um período em que a violência doméstica era um tabu, reforça a urgência de revisões. Ele propôs aprimorar a Lei Maria da Penha para estabelecer parâmetros mais claros de produção de provas nestes casos.

Projeto de Lei e liderança brasileira

Entre as propostas debatidas está o Projeto de Lei 565/2022, aprovado pela Câmara e em análise no Senado, que considera a existência de risco para mãe e filhos em países onde não há mecanismos efetivos de proteção contra violência doméstica.

Flavia Ribeiro Rocha, representante do Ministério da Justiça, destacou que o Brasil deve assumir protagonismo no tema ao liderar um fórum internacional sobre violência doméstica. 

“Precisamos de mecanismos mais específicos e sensíveis para aplicar a Convenção. O Brasil pode contribuir significativamente com soluções”, afirmou.

Relatos de impacto: as “Mães de Haia”

Um momento marcante da audiência foi o depoimento de Raquel Cantarelli, uma das chamadas “Mães de Haia” – mulheres que perderam a guarda dos filhos após decisões judiciais baseadas no tratado. Ela relatou a dificuldade em apresentar provas de crimes graves, como abuso sexual e cárcere privado, cometidos pelo pai de suas filhas na Irlanda.

“Nossas vidas foram violadas por um erro judicial que feriu profundamente os princípios de proteção e dignidade humana”, disse Raquel, que aguarda uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para recuperar a guarda das crianças.

Próximos passos

A audiência reforçou a necessidade de harmonizar a Convenção de Haia com legislações nacionais que reconheçam os direitos das mulheres e crianças em contextos de violência doméstica. Parlamentares e especialistas acreditam que o Brasil tem a oportunidade de liderar mudanças internacionais, garantindo proteção às vítimas e prevenindo novos casos de injustiça.

Assista à íntegra da audiência pública neste link.

Com informações da Agência Câmara 


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Pedro Micussi