BLM, semente de uma alternativa política

Todas as conquistas que a comunidade afro-americana obteve tiveram de ser ganhas por via revolucionária.

António Louçã 18 ago 2020, 14:23

Sob o lema “Black Lives Matter” (BLM), a vaga de manifestações iniciada nos EUA e em todo o mundo com o homicídio de George Floyd é muito mais do que um reflexo de autodefesa de comunidades negras contra a brutalidade policial. Se fosse só isso, já não seria pouco. Mas é muito mais.

Nos EUA, a comunidade afro-americana detém vários recordes estatísticos, nenhum deles invejável. Os negros sofrem de desemprego crónico muito mais do que os brancos, são mais atingidos por crises agudas como a do subprime, são condenados em penas mais pesadas pelos mesmos delitos, estão sobrerepresentados na população prisional e são a carne de canhão mais sacrificada nas guerras do imperialismo ianque.

A comunidade afro-americana é, acima de tudo, uma prova viva do “pecado original” norte-americano – a hipocrisia. Os EUA tornaram-se independentes ao som da proclamação de Thomas Jefferson, de que todos os seres humanos nascem livres e iguais em direitos. Mas, dos sete “pais fundadores” dos EUA, só John Adams era um militante antiesclavagista e só Benjamin Franklin renegou o seu passado esclavagista; os outros cinco, incluindo Washington e o próprio Jefferson, eram proprietários ou negociantes de escravos. A pátria dos direitos humanos universais continuou a ser durante quase um século (1776-1862) a maior economia esclavagista do planeta. Em vésperas da guerra civil, os Estados do Sul contavam quatro milhões de escravos.

Depois de abolida a escravatura, permaneceu durante mais um século o regime de apartheid que só o movimento dos direitos cívicos viria eliminar na letra da lei. E mesmo hoje permanecem na vida real as desproporções apontadas atrás, e muitas outras, que revelam mais sobre o verdadeiro regime de um país do que a letra da lei.

A longa marcha das conquistas parciais

Todas as conquistas que a comunidade afro-americana obteve tiveram de ser ganhas por via revolucionária. Não tinha fundamento a expectativa de que o capitalismo viesse, de forma natural e indolor, colocar o trabalho assalariado no lugar do trabalho escravo. O que o capitalismo manchesteriano, da revolução industrial, continuava a fazer com a maior naturalidade era comprar algodão à agricultura esclavagista da Carolina do Sul, da Virgínia, do Alabama. O capitalismo da indústria transformadora precisava de matéria-prima barata, fornecida pelo capitalismo agrário, exportador, com a sua força de trabalho gratuita.

Para ser abolida a escravatura, foi precisa uma guerra civil que durou quatro anos e, só por si, custou mais de meio milhão de vidas norte-americanas – um número superior ao que custaram, todas somadas, as guerras do imperialismo norte-americano até à do Vietname. Esta segunda revolução americana não aboliu a discriminação racial, mas pelo menos deu aplicação prática à retórica anti-esclavagista de Jefferson.

A burguesia ianque não fez a guerra para acabar com a escravatura: foi a burguesia sulista que desencadeou a guerra para expandir os territórios à disposição da economia esclavagista. E fê-lo com tal determinação que, nos dois primeiros anos da guerra, a sorte das armas chegou a pender para a Confederação dos Estados do Sul. Encurralado, Lincoln teve de substituir o general George McCellan, de lealdade duvidosa, pelos enérgicos Ulysses Grant e William Sherman e, principalmente, teve de decidir-se a proclamar a abolição da escravatura para galvanizar o apoio dos oprimidos e desse modo assestar um golpe decisivo na burguesia sulista.

A dramática viragem da guerra anunciava um pós-guerra igualmente dramático.  Em 1865, iniciaram-se os chamados anos da Reconstrução, em que os escravos negros libertados se aliaram aos brancos pobres do Sul para criarem uma democracia autêntica e igualitária. Mas a dinâmica de revolução permanente que animava esse bloco social era muito diferente da agenda que vigorava na Casa Branca e no Capitólio, principalmente desde o assassínio de Lincoln. Em breve, os negros libertados e os brancos pobres se viram subjugados pela burguesia sulista que voltava a gozar do apoio central. Seguiu-se um século inteiro de apartheid sem escravatura.

Foi o tempo das leis de “Jim Crow”, implementadas pelos poderes estaduais e tendo como braço extralegal o Ku Klux Klan. O apartheid significava que no espaço público, nas escolas, nos transportes colectivos, continuava a haver segregação. O complemento inseparável desta realidade social era o terrorismo supremacista, com os seus atentados e linchamentos impunes. Uma larga parafernália de exigências legais reservava o direito de voto aos cidadãos mais abastados e dele excluía sistematicamente os negros. Segregada da vida política, a comunidade afro-americana refugiava-se numa variedade de igrejas ou em utopias independentistas.

A luta pela autoorganização negra

O malogro da Reconstrução frustrara as expectativas que quatro milhões de escravos negros tinham alimentado sobre a aliança com os brancos pobres. Empalidecia a ideia de os oprimidos poderem unir-se contra a opressão.

O intelectual negro socialista William Edward Burghardt Dubois, apesar da sua perspicácia e erudição, ficou quase condenado a pregar no deserto, enquanto multidões entusiásticas seguiam o grande demagogo Marcus Garvey. Nascido na Jamaica, com uma história de vida movimentada e cosmopolita, Garvey apelou aos negros de vários países americanos para “regressarem” a África e ganhou influência nos EUA graças ao sentimento generalizado do fracasso da Reconstrução.

Num país sem esperança, multidões negras voltavam os olhos para o continente das suas origens ancestrais. A Libéria, país criado no século XIX com escravos libertados ou fugidos, chegou a ser idealizada como versão negra da “terra prometida”. Mas o paraíso terrestre que Garvey descrevia aos seus seguidores era desmentido pela realidade do atraso e da pobreza. Nos EUA, a campanha por um 49º Estado da União, dirigido e governado pela população negra, nem sequer chegou tão longe. Ao contrário da Libéria, o tal Estado negro norte-americano nunca chegou a existir.

A forte pulsão separatista dos anos 1930 reflecte-se nas discussões de Trotsky sobre a autodeterminação dos negros americanos. O trotskista norte-americano Cyril Lionel Robert James de certo modo contesta a ideia da autodeterminação, argumenta que os seguidores de Garvey não sabem exactamente o que querem, que eles na verdade anseiam por um governo negro dos EUA, não por um Estado próprio. Trotsky não preconiza a emigração para a Libéria, nem a criação do 49º Estado, mas defende que o partido revolucionário deve apoiar a comunidade negra se esta quiser tornar-se independente. A luta pela igualdade de direitos na democracia norte-americana está para Trotsky, claramente, subordinada ao direito de autodeterminação da comunidade negra.

Numa outra discussão mais consensual, pondera-se a criação de uma organização negra, que não tem de ser uma frente de massas do partido nem um mero viveiro para recrutamento de quadros do partido. Apoiando o projecto dos militantes norte-americanos da Quarta Internacional, Trostky define-o como “uma espécie de escola pré-política”, necessária pelo facto de a opressão dos negros ser “tão forte que eles a sentem constantemente, que a sentem como negros. Nós devemos encontrar a possibilidade de dar uma expressão politico-organizativa a este sentimento”. Ainda segundo Trotsky, o próprio partido deve tomar a iniciativa de promover a criação de uma força organizada que não irá controlar.

Corriam os anos 1930 e ambas as discussões teriam ainda de ser submetidas à prova dos factos. Aproximavam-se várias décadas de luta de classes intensa, num processo ininterrupto que ainda hoje continua.

A luta por uma cidadania de pleno direito

No período entre as guerras e na Segunda Guerra Mundial, numerosas famílias negras e em especial os jovens sufocados pelo regime sulista migraram massivamente para os Estados do norte, para se alistarem no Exército ou para trabalharem em indústrias de armamento desesperadamente carenciadas de braços.

Mas o capitalismo engendra racismo onde quer que exista, e não apenas nos Estados do sul. Os patrões da indústria bélica empregavam com salários inferiores os negros recém-chegados. Os velhos sindicatos profissionais da AFL ressentiam-se da disposição dos novos colegas a trabalharem por menos dinheiro e viam na subserviência inicial dos trabalhadores negros uma confirmação do seu preconceito racista. Círculo vicioso, viravam-lhes as costas e inventavam todos os pretextos para impedirem a sua filiação nos sindicatos.

Essa realidade não era, por outro lado, inelutável. Uma nova central de modernos sindicatos de indústria, a CIO, animou lutas em que os trabalhadores negros participaram activamente e, por vezes, com um papel de vanguarda. Philip Randolph organizou os trabalhadores negros num dos sindicatos ferroviários e em breve se tornou um interlocutor incontornável para o poder político necessitado de apoios para o esforço de guerra.

Quando a AFL absorveu a CIO e o racismo dos seus velhos burocratas se impôs, mais ou menos camuflado, como atitude da AFL-CIO, a realidade objectiva já tinha sofrido algumas transformações irreversíveis. O presidente Franklin D. Roosevelt, até aí indiferente às reivindicações de direitos civis, teve de fazer-lhe concessões. Depois da sua morte e depois do fim da guerra, o ultra-reacionário presidente Harry Truman teve de prosseguir nesse caminho.

Mas a legislação que se ia plasmando no papel continuava a ter um impacto modesto na vida real. Era preciso recorrer aos métodos da desobediência civil. Só assim o movimento antisegregacionista conseguiria abolir o regime “Jim Crow” e instituir uma igualdade formal: nos transportes públicos, nas escolas e no direito de voto. O grande dirigente desse movimento, Martin Luther King, levou a sua campanha de cidade em cidade, boicotando transportadoras segregadas ou reclamando a entrada de crianças negras nas escolas reservadas aos brancos. Em 1963, organizou uma enorme manifestação em Washington, onde proferiu o famoso discurso que começava com a frase “I have a dream” [Eu tenho um sonho].

Direitos cívicos e guerra do Vietname

A presidência de John Kennedy e, depois do seu assassínio, a de Lyndon Johnson não reprimiram abertamente o movimento contra a segregação, embora o FBI procurasse sabotá-lo na sombra. Mais uma vez, os inquilinos da Casa Branca procuravam obter o apoio afro-americano para uma guerra que tinham entre mãos, agora a do Vietname. E King deixou pairar, durante vários anos, uma certa ambiguidade sobre a sua atitude em relação à guerra.

Mas a lua-de-mel que alimentou com o poder político estava condenada a acabar. Depois de conseguir dessegregrar escolas e transportes, ele tentou pôr de pé iniciativas comunitárias que resolvessem problemas sociais, ao nível da habitação ou do desemprego. Essas iniciativas pressupunham revolucionar as políticas orçamentais, dedicar largas verbas à assistência social, criar um Estado providência de tipo social-democrata. Acontece que a prioridade orçamental das administrações americanas era a guerra, que King até aí tinha evitado pôr em causa.

Entretanto, os soldados negros morriam no Vietname mais que os brancos. Na retaguarda não obtinham adiamentos para estudar e, uma vez chegados à frente, eram tratados como carne para canhão. Inevitavelmente, começavam a levantar questões incómodas: Muhamad Ali sacrificou a sua carreira desportiva e recusou tornar-se um ícone da beligerância negra com um par de frases famosas: “Querem que eu vá para o Vietname matar gente de cor que nunca me linchou, nunca me chamou ‘preto’, nunca assassinou os meus dirigentes”. O maior pugilista de todos os tempos lançava desse modo à cara da opinião pública belicista um discurso incendiário, que parecia fazer eco à famosa proclamação de Karl Liebknecht: “O inimigo está no nosso país”.

Pressionado pelas circunstâncias e por tomadas de posição como a de Muhamad Ali, King lançou-se de corpo inteiro na campanha anti-belicista e lembrou que os negros americanos estavam a ser mandados para o Vietname, supostamente para defenderem uma democracia que lhes era negada no seu país. Em mais uma grande manifestação que em 1967 convergiu sobre Washington, desta vez contra a guerra, King foi uma das presenças mais destacadas. O movimento negro foi uma componente da frente de recusa, ampla e de todas as cores, contra a guerra do Vietname.

Ao definir-se sobre a guerra, o movimento de direitos cívicos atingia os seus limites. Dissipadas as expectativas de neutralizar o movimento negro na questão da guerra, a Casa Branca endurecia a sua atitude. As duas figuras mais carismáticas do movimento negro foram assassinadas: logo em 1965, Malcolm X, um anti-belicista da primeira hora; e finalmente, em 1968, o próprio Martin Luther King. Na América profunda, agora com as costas quentes ao nível do poder central, e por isso com atrevimento crescente, os caciques racistas multiplicavam as provocações. Em banais incidentes de rua, em controlos rodoviários, as brutalidades policiais recrudesciam.

Os métodos da desobediência civil, da resistência passiva e da não-violência tinham esgotado o seu papel histórico. Ainda antes de ser assassinado, King já se encontrava ultrapassado pelos acontecimentos. Dando continuidade a revoltas como a de Harlem, em 1964, ou a de Watts, em 1965, começava a impor-se um novo modelo de resposta negra com as grandes insurreições urbanas, sempre desencadeadas pela violência policial, como em Newark e Detroit, em 1967.

Um parêntesis: o Partido das Panteras Negras

O movimento do Poder Negro e, posteriormente, o Partido das Panteras Negras (BPP) tentaram resolver vários dilemas que o movimento negro enfrentava no fim da etapa dos direitos cívicos. Um dos dilemas era o de lutar por um Estado negro ou, em alternativa, pela integração num Estado multirracial, com igualdade de direitos. O outro era o de observar um estrito princípio de não-violência ou, em alternativa, organizar a autodefesa do movimento face a atentados cada vez mais mortíferos dos “vigilantes” ou polícias racistas.

Malcolm X foi assassinado cedo demais para poder assistir aos primeiros passos do Poder Negro ou do BPP. Tendo iniciado o seu percurso de dirigente na corrente muçulmana, como King iniciara o seu na corrente cristã, Malcolm distinguia-se de King por ter rompido mais radicalmente com as origens religiosas para assumir um papel à cabeça do movimento negro e por ter em curso uma espectacular evolução para o internacionalismo revolucionário.

O questionamento que Malcolm X fazia do pacifismo estava marcado pela revolução mundial, pelas vitórias da revolução chinesa, da revolução cubana, das lutas de libertação africanas. O impasse a que o movimento dos direitos cívicos tinha chegado parecia exigir um balanço crítico dos métodos não-violentos. E parecia, além disso, exigir uma reflexão sobre os limites do integracionismo: mesmo quem não estivesse tentado a voltar à fórmula separatista do falecido Marcus Garvey via-se confrontado, no final dos anos 1960, com a realidade de um país que, apesar da legislação obtida, continuava marcado pela desigualdade social e racial.

O tempo estava maduro para procurar uma nova estratégia, Malcolm X começara a procurá-la e desse modo inspirou o movimento do Poder Negro. Líderes como Stokely Carmichael, sem reclamarem um Estado negro, procuraram garantir um controlo dos ghettos negros, limitar aí a influência branca e a intervenção da polícia racista. A presidência de Richard Nixon viu nesta estratégia a oportunidade para promover um “capitalismo negro”, subsidiando os negócios de uma burguesia negra que deveria tornar-se a correia de transmissão para o controlo do poder sobre esses ghettos potencialmente explosivos.

Mais do que o movimento do Poder Negro, o BPP, dirigido por figuras como Huey Newton e Eldridge Cleaver, procurou superar o impasse da resistência passiva e responder ao problema da violência racista sem sair da legalidade. Invocou o direito de andarem armados que a Constituição confere aos cidadãos, organizou a partir de Oakland e depois noutras cidades patrulhas de quatro militantes para intervirem nos habituais incidentes com a polícia.

O sucesso inicial deste método não permitia, contudo, alimentar ilusões. Em breve a polícia ia reagir com a maior violência e os patrulheiros começavam a ser abatidos como tordos. O BPP era, assim, empurrado para se militarizar e clandestinizar cada vez mais. A inspiração que Malcolm X encontrara nas vitórias de massas pelo mundo fora, começaram os líderes do BPP a procurá-la nos métodos que, em circunstâncias específicas, tinham sido os dessas vitórias. Tomando a nuvem por Juno, quiseram imitar o maoismo, o castrismo, o guevarismo, em solo norte-americano. O confronto contra o aparelho militar e policial era uma batalha perdida de antemão. Dezenas de dirigentes do BPP foram mortos, centenas foram presos. O partido foi esmagado pela repressão.

O segundo fôlego das insurreições urbanas

A vaga de manifestações desencadeada pelo assassínio de George Floyd já é considerada o mais amplo, massivo e persistente movimento de massas que alguma vez ocorreu na História dos EUA. Um dos seus pontos altos foi a jornada de 6 de junho, com cerca de meio milhão de pessoas a manifestarem-se um pouco por todo o país. Segundo sondagens recentes de institutos insuspeitos e conservadores, o número de manifestantes que participaram em algum tipo de protestos desde o assassínio de Minneapolis anda entre os 15 e os 26 milhões.

Trata-se de um número muito superior ao do processo de luta pelos direitos cívicos, que envolveu centenas de milhares de pessoas, mas tem em comum com esse processo o seu carácter multirracial e vai muito além dele na capacidade demonstrada para fracturar as forças repressivas (se, por um lado, se sucedem os incidentes com polícias tomados de pânico e histeria contra os manifestantes, por outro lado, registam-se também os casos de agentes que se apresentam desarmados nas manifestações, para nelas desfilarem também).

Não é este o momento para proceder a uma análise do que tem sido essa vaga de manifestações. O que aqui importa é enunciar algumas ilações políticas que ela sugere.

Em primeiro lugar, a BLM é tudo menos um movimento despolitizado e acéfalo. Ela ergue-se, na sociedade norte-americana, de mãos dadas com um inesperado ressurgimento de popularidade das ideias socialistas, patente no eco que apesar de tudo obteve a campanha de Bernie Sanders e no sucesso eleitoral de candidaturas parlamentares que a si próprias se apresentam como socialistas (quase todas de mulheres, todas de minorias étnicas).

Depois, a actual vaga de insurreições urbanas insiste em colocar diante dos nossos olhos uma alternativa ao pacifismo do movimento de direitos cívicos que as revoltas pioneiras dos anos 1960 colocavam já perante os olhos dos “panteras negras”: a acção directa realmente eficaz não se organiza em células clandestinas e sim com o impulso das massas. Os métodos da China, Cuba, Argélia e das libertações africanas não se aplicam nos EUA – mas os métodos insurrecionais dos EUA aplicam-se, com sucesso, nos EUA. A alternativa política a organizar não poderá medir-se com os esbirros da CIA ou do FBI no terreno da conspiração, mas poderá dar um sentido e um futuro aos protestos mais ou menos espontâneos de hoje, no terreno da agitação política em terreno aberto.

Essa alternativa não aponta para um Estado negro, e sim para uma iniciativa e uma vanguarda negra na sociedade norte-americana. A hipótese de Trotsky sobre a autodeterminação negra, formulada nas discussões dos anos 1930, não foi confirmada pela História dos EUA nem pela História do mundo nas décadas seguintes. Mas a pista que avançou sobre a autoorganização negra continua a ser uma hipótese de trabalho fecunda, se não for tomada como o regresso a uma política de ghetto, e sim como a assunção de um papel dirigente da comunidade negra na libertação do conjunto das comunidades norte-americanas, por ser aquela que tem concentrado em si própria as mais intensas experiências de sofrimento com os males do capitalismo e as mais exemplares experiências de luta contra ele.

 Publicado pelo MAS (Portugal) mas.org.pt


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