Decadência brasileira

Decadência brasileira

É fundamental oferecer um programa popular de saída da crise a que os capitalistas arrastam o Brasil. Por isso, defendemos a candidatura própria do PSOL com Glauber Braga.

Israel Dutra e Thiago Aguiar 10 dez 2021, 21:28

A política de destruição do Brasil promovida pelo governo Bolsonaro não limites. As notícias de que Augusto Heleno teria atuado no Gabinete de Segurança Institucional em favor da autorização do garimpo no Amazonas são mais um golpe deste governo em benefício da espoliação do meio ambiente, de áreas públicas e de territórios de povos tradicionais. Tais medidas não são casuais e se inscrevem num plano mais geral do governo de destruir uma série de conquistas democráticas das últimas três décadas, após a queda da ditadura militar.

Ao mesmo tempo, trata-se de um projeto vinculado a uma nova localização brasileira no cenário internacional, ainda mais subordinada, por opção de uma fração hegemônica da burguesia que busca ampliar sua acumulação: um projeto de destruição nacional, conduzido por Bolsonaro, voltado à exploração máxima e predatória da terra, do trabalho e dos recursos naturais, coroada pela desindustrialização e pauperização de amplas massas. Um verdadeiro garimpo em todo país.

Quando fechávamos este editorial, recebemos a notícia de mais uma tragédia: um trabalhador da empresa pública Proguaru sofreu um infarto na fila para assinar sua demissão em Guarulhos (SP). Após meses de luta, a decisão da prefeitura do município paulista e da burguesia local de liquidar a empresa ilustra a decadência geral, que se agrava no país, e se expressa na morte, como a das centenas de milhares de vítimas do negacionismo bolsonarista nos últimos dois anos.

A dimensão do desastre

O retrocesso é evidente em todos os índices socioeconômicos divulgados recentemente, como a queda da renda dos trabalhadores de 12% em 10 anos. Igualmente, o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Brasil, medido pela ONU, retrocedeu, fazendo o país cair cinco posições nos últimos anos (da 79ª posição mundial para a 84ª). Cresceram também o desemprego, a informalidade, a fome e a insegurança alimentar, que já supera a marca dos 20 milhões de brasileiros. Não há outro nome para isso que não “decadência estrutural”.

As mentiras de Guedes e a luta ideológica ao redor da interpretação do aumento dos juros e da inflação não podem esconder que a situação brasileira é ainda pior do que a prevista para 2021. O Produto Interno Bruto (PIB) caiu 0,1% no terceiro trimestre, conforme dados do IBGE, após queda de 0,4% no trimestre anterior. Com isso, o Brasil entrou num cenário de recessão técnica. Na vida real, o retrocesso pode ser ilustrado pela queda do nível de vida do povo: mesmo a cesta básica mais barata entre as capitais custa o dobro da parcela média do “Auxílio Brasil”. Não por acaso, 70% da população avaliam que a situação da economia brasileira é ruim ou péssima.

A interdição de um projeto nacional

A falência dos governos de conciliação de classe, superados por um golpe parlamentar dado pelo então parceiro estratégico do PT, o MDB de Michel Temer, não foi substituída por um projeto mais avançado, capaz de remover o entulho autoritário do Estado brasileiro, encarar os gargalos principais do país e destravar o caminho para um desenvolvimento econômico e político independente voltado para a maioria social. A vitória de Bolsonaro, há quase quatro anos, intensificou ainda mais o ajuste e a exploração da burguesia mais predatória contra o povo, o meio ambiente e o patrimônio nacional.

Não é coincidência a destruição das estatais, já bastante desmontadas como a Petrobrás, que se tornou uma “máquina de dividendos” ao adotar uma política de paridade de preços internacional em benefício dos interesses dos grandes financistas internacionais. Ao mesmo, há uma crise ideológica e de horizonte: numa época de crise do capitalismo global, interditou-se o debate a respeito dos rumos da economia brasileira e das possibilidades de desenvolvimento. Na política, na imprensa e mesmo na academia, salvo poucas e honrosas exceções, há uma diferença apenas de “dosimetria” de “reformas”, “ajuste estrutural”, “consolidação” e “privatizações”.  Na realidade, a classe dominante deslocou-se de quaisquer preocupações “nacionais” e o Estado deve ser uma plataforma para garantir sua acumulação e para o controle e a repressão das fileiras crescentes de uma população supérflua, desempregada e abandonada. Somente as classes trabalhadoras e as massas populares podem construir uma saída para o Brasil, lutando para controlar as alavancas do Estado e da acumulação e colocando-as a serviço de um processo de transformações estruturais, garantindo emprego, salário e as condições para sua reprodução.

A urgência da esquerda e de um programa

Diante de tamanha tragédia, não podemos ficar prostrados. Temos que atuar, com o setor de massas que fez a experiência e se deslocou para o campo da oposição ao governo, ainda que Bolsonaro lute para restituir apoios e alguma viabilidade eleitoral. Para isso, é fundamental oferecer um programa popular de saída da crise a que os capitalistas arrastam o Brasil. O PSOL é um partido que conquistou autoridade por sua localização por fora das negociatas das direções majoritárias que já governaram o país. E agora tem uma enorme responsabilidade: enquanto Lula viaja o país para construir um novo pacto social com o velho pragmatismo e defende Geraldo Alckmin como seu vice, é preciso consolidar e oferecer um programa emergencial de medidas concretas para mudar a realidade, que busque acabar com a fome e o desemprego, atacando os mais ricos – o 0,1% que controla a maioria da riqueza e da renda.

Por isso, defendemos a candidatura própria do PSOL com Glauber Braga como parte do esforço para derrotar Bolsonaro e incidir no debate programático que os setores da oposição – de esquerda e centro-esquerda – deveriam fazer. Defendemos um programa que inclua, entre outras medidas, a taxação das grandes fortunas, o estancamento da sangria da dívida pública, o combate sem tréguas aos interesses do capital financeiro, a reversão do atual modelo agroexportador e da mineração predatória, uma reforma agrária que cuide dos territórios e defenda nossas florestas, a ampliação das redes de pequenos produtores para gerar alimentos a custo baixo para um mercado nacional de massas, quebrando o eixo do “agro é pop”, dos grandes latifundiários e grileiros de terra. Queremos, desse modo, que o PSOL ocupe seu lugar e se coloque em ação: nosso partido deve ser uma ferramenta a serviço da luta do povo brasileiro em defesa de um projeto de esperança, contra a decadência nacional.


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