31-O: República Catalã se estanca e se converte em um problema europeu

Estupefação. Desilusão. Desorientação. Esse era o estado de ânimo geral das pessoas e ativistas que estavam apoiando o processo. A proclamação da República termina assim?

Alfons Bech 2 nov 2017, 11:51

Em um artigo que escrevi antes de começar minhas crônicas pus o título de “Dez dias que comoveram a Europa”, aludindo aos acontecimentos de 20 de setembro até o referendo de 1º de outubro. No entanto, é dizer o mínimo. Por um lado, não são apenas dez dias, e, pelo outro, o problema catalão se instalou na Europa para não deixá-la.

A proclamação da independência e a República Catalã está assumindo um giro em toda a situação. Em primeiro lugar na Catalunha e Espanha. A proclamação esteve a ponto de não produzir-se. Puigdemont, com o apoio de parte de seu partido PDeCat, dos nacionalistas bascos do PNV e dos socialistas catalães, esteve a ponto de aceitar convocar eleições autonômicas, em troca de que o Estado não aplicara o artigo 155 que intervêm na autonomia catalã.

Mas o PP não quis tal compromisso. Queria vingança por querer a Catalunha (80%) exercer seu direito a decidir. Queria que recaísse “o peso da lei” manipulada sobre o independentismo. Queria mais presos políticos, sanções, domínio absoluto sobre uma “Catalunha é da Espanha”. A visão centralista, imperial, ditatorial, se impôs sobre qualquer visão política, de resolução pacífica e dialogada do conflito nacional. Isso e o risco de ruptura da frente soberanista foi o que acabou por decidir que Puigdemont proclamasse a República e abrisse o processo constituinte.

No entanto, através da proclamação da República e o começo simultâneo de aplicação do 155, o Governo e a Presidenta do Parlamento da Catalunha decidiram não oferecer resistência ativa. A Presidenta Forcadell decidia dissolver o Parlamento ontem, segunda-feira, depois de ir à sua sede. O Governo decidia não aparecer publicamente. Só dois Conselheiros, o de Economia e vice-presidente Junqueras, e o de Território, Rull, foram aos seus despachos. A especulação sobre onde estava o Presidente do Governo e o resto dos Conselheiros foi tema de discussão durante todo o dia. Até que pela tarde vazou que Puigdemont e metade do Governo se encontravam em Bruxelas.

Estupefação. Desilusão. Desorientação. Esse era o estado de ânimo geral das pessoas e ativistas que estavam apoiando o processo. A proclamação da República termina assim? Nas reuniões de CDRs do sábado anterior não se adotaram ações concretas, se bem que havia propostas de boicotar as eleições autonômicas do próximo 21 de dezembro. As de sindicalistas independentistas adiaram uma declaração a espera de que se clareie a situação, ainda que se parte de seguir a luta. Soube-se que o maior sindicato, CCOO, não quis apoiar uma manifestação pela liberdade dos presos e contra a aplicação do 155.

No nível do Estado, os dois principais sindicatos, CCOO e UGT, pediam uma “aplicação suave” do 155. Mas ANC e Ómnium não convocaram tampouco nenhuma ação, todavia. Em troca sim o fizeram os unionistas, com apoio do PP, Ciudadanos e PSC-PSOE, acompanhados de unionistas de toda Espanha, que encheram de novo o centro de Barcelona e onde os setores ultras protagonizaram violentas cenas contra jornalistas, independentistas e imigrantes, como na ocasião anterior.

Tudo ficou assim adiado. Suspendido. Os líderes da República catalã preferiram não ir ao enfrentamento em umas condições que consideraram que propiciariam derramamento de sangue, e dariam a desculpa para a intervenção do exército e a aplicação generalizada da repressão e ilegalizações por “rebelião”.

No entanto, junto a esta estratégia aparece também que não havia um plano B previsto. A direção do “processo” ficou calada durante três dias chaves. A desaparição da cena dos líderes, a falta de consignas, de ideias de mobilização, mostra que a República está descabeçada. Ou, como disse o diretor do jornal burguês nacionalista ARA, é uma República “líquida”.

E agora o que? Perguntam-se os cidadãos. Puigdemont apareceu em coletiva de imprensa em Bruxelas para explicar que ele e a metade de seu governo permanecem na capital da Europa para fazer frente à aplicação do 155 e seguir exercendo como tal. Ou seja, por falta de garantias jurídicas não se entregam, não facilitam para Rajoy, desafiam a autoridade e legalidade espanhola. Isto está muito bem. Mas não é suficiente. O resto dos Conselheiros ficou na Catalunha. Que farão uns e outros? Impulsionarão a mobilização – tão pacífica quanto se queira – pela liberdade dos Jordis? Que fazer contra a aplicação diária do 155, ou seja, contra que assumam as competências de Mossos, Ensino, Economia…?

Frente a tudo isso não se disse nada. Os partidos soberanistas agora estão mais pendentes da participação nas eleições de 21 de dezembro que de outra coisa. Quiçá haveria que dizer que só se vê a resistência a partir de reorganizar-se e ganhar essa batalha eleitoral, ainda que seja autonômica e convocada por Rajoy. O processo tem que adaptar-se, pois, rapidamente. As novas condições realinharam as forças. Falaremos mais das alianças que se irão definindo. Mas o processo segue vivo no ânimo das pessoas.

(Tradução da crônica em espanhol disponível no Portal de la Izquierda).


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