Mobilização contra o golpe no Peru
Foto: Luis Iparraguirre, CC

Mobilização contra o golpe no Peru

Não à prisão de Castillo; novas eleições adiantadas; e convocação de uma assembleia constituinte.

Israel Dutra e Thiago Aguiar 12 dez 2022, 20:50

A semana passada terminou com um sabor amargo para a torcida brasileira. Após uma campanha irregular, a seleção voltou mais cedo para casa, deixando o sonho do hexa na derrota nos pênaltis para a Croácia. Também semana passada, o governo Lula anunciou os primeiros nomes de seu ministério, sem grandes surpresas. Após a diplomação nesta segunda-feira (12), novos anúncios devem ocorrer.

Entretanto, o acontecimento político mais importante da semana passada ocorreu no Peru. É importante chamar a atenção para o que está passando em nosso país vizinho: um golpe, orquestrado pelo parlamento dominado pelo fujimorismo, resultou na deposição do presidente Pedro Castillo. Trazemos ao debate, portanto, as primeiras impressões sobre os acontecimentos no Peru, bem como as diferentes posições que a esquerda e mesmo os chefes de Estado têm adotado nesse processo, que ainda está em aberto, como mostram as manifestações do final de semana contra o golpe, que resultaram na morte de quatro jovens manifestantes,

O que aconteceu? A natureza política da queda de Castillo

A crise institucional que levou à queda do presidente Pedro Castillo, eleito em 2021, chegou ao seu ápice no dia 7 de dezembro, quando seria votada mais a terceira tentativa terceira do parlamento peruano de aprovar uma moção de vacância da presidência. De forma errática, Castillo tentou defender-se da destituição convocando a dissolução do congresso, sem apelar às mobilizações e construir com seus aliados e o campo popular. O desfecho foi trágico: em um golpe de caráter reacionário, Castillo foi preso e em tempo recorde tomou posse a vice-presidente, Dina Boluarte.

Como muito bem definiram os camaradas de nossa organização-irmã, “Súmate”, integrante do Movimento Novo Peru (MNP):

“Desde o primeiro momento em que a direita descobriu que foi derrotada no segundo turno das eleições gerais do Peru, essa mesma direita racista e classista política, empresarial e midiática não aceitou que uma pessoa do campo, um professor rural, de língua quíchua e vestindo um sombrero fosse presidente. Mesmo que Pedro Castillo não tenha posto em risco os interesses econômicos da classe empresarial e tenha uma linha de continuidade neoliberal, eles não aceitavam que um presidente com essas características deveria ter vencido as eleições; classismo e racismo é a combinação para dar vida a um golpe”.

A situação no Peru é de crise institucional recorrente. Apenas no intervalo de seis anos, desde 2016, três presidentes foram destituídos pelo congresso: Pedro Pablo Kucinski, Vizacarra e Merino, além de três outros presos por corrupção. Foi nesse contexto que Pedro Castillo surpreendeu a todos e ganhou a eleição de 2021. Um professor, vindo do Peru profundo, de origem indígena, Castillo se projetou como liderança da greve nacional de 2017, superando a tradicional burocracia sindical.

Houve um cerco do congresso fujimorista ao governo durante 15 meses. Castillo teve seu governo marcado por diversas crises, chegando a ter mais de 100 ministros em pouco menos de um ano e meio de gestão. Com a tentativa de dissolução do congresso e decretação de estado de sítio, Castillo precipitou os acontecimentos. Sua prisão praticamente imediata e a posse de Dina contaram também com o apoio do imperialismo.

Duas atitudes diante da crise peruana

Os setores da burguesia internacional, a embaixada dos Estados Unidos e a grande mídia foram rápidos em aceitar a queda de Castillo e a posse de Dina. A Folha de S.Paulo, coerente com seus interesses de classe, vaticinou em editorial de 9 de dezembro: “Um golpista a menos”.

Já entre os governos latino-americanos ditos progressistas, houve duas atitudes, levando em conta que a situação do Peru é parte de um processo de instabilidade e polarização: Gustavo Petro (Colômbia) e López Obrador (México) defenderam o antigo governante e, mesmo fazendo críticas a sua linha errática, reconheceram o caráter reacionário da manobra/golpe parlamentar. AMLO, inclusive, ofereceu asilo para Castillo.

Lula, por sua vez, reconheceu imediatamente a posse de Dina, acompanhando lamentavelmente a posição da embaixada dos Estados Unidos. O presidente eleito afirmou que “tudo foi encaminhado no marco constitucional. O que o Peru e a América do Sul precisam neste momento é de diálogo, tolerância e convivência democrática”. No comunicado, Lula também disse esperar que a nova presidente do país vizinho, Dina Boluarte, tenha “êxito em sua tarefa de reconciliar o país e conduzi-lo no caminho do desenvolvimento e da paz social”.

A polarização vai seguir! É necessária uma esquerda anticapitalista e internacionalista

Apesar do desfecho do golpe e da prisão de Castillo, o movimento popular está lutando. As cidades do “sul rebelde” estão se levantando contra os golpistas e uma greve geral está sendo convocada para o dia 15. A última declaração do MNP deixa clara uma orientação: não à prisão de Castillo, novas eleições adiantadas e convocação de uma assembleia constituinte.

O MES tem buscado aprofundar sua relação com os camaradas peruanos, do Sumate: organizamos uma reunião de emergência e estamos publicando as principais declarações e notícias para informar ao público brasileiro. A situação ainda não se fechou. A última palavra não foi dada e o povo peruano está indo à luta.

A luta vai seguir e deve servir de lição: sem mudar as engrenagens profundas do Estado e apelar para outra institucionalidade baseada no poder popular, as vitórias são limitadas e serão constantemente sabotadas pelos interesses e poderes da classe dominante. Para dar conta disso, devemos seguir construindo uma esquerda anticapitalista e internacionalista, apoiando e aprendendo as lições de nossos povos. Para isso também nos preparamos para os debates dentro do PSOL, mantendo sua coerência e independência.


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